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DOI: https://doi.org/10.48160/18517072re51.49
Gap de gênero na ciência em tempos de COVID-19:
um panorama do Brasil
Márcia Maria Tait Lima
*
Rebeca Buzzo Feltrin
**
Gedalva de Souza
***
Resumo
No Brasil, embora as mulheres sejam maioria nos cursos de pós-graduação, ainda
enfrentam dificuldades de se manterem e de ascenderem nas carreiras acadêmicas.
O androcentrismo das universidades, o ambiente extremamente competitivo, somado
à sobrecarga de trabalhos domésticos e de cuidados tradicionalmente impostos às
mulheres, faz com que elas sejam penalizadas nessas carreiras. No período da
pandemia de COVID-19, onde as pesquisadoras estão trabalhando remotamente,
essas dificuldades ficaram mais evidentes, se traduzindo em diminuição de produção
e ampliando as desigualdades de gênero na academia. A proposta do artigo é discutir
os desafios enfrentados pelas pesquisadoras em meio à pandemia e as
potencialidades, trazidas pela crise, de mudança na lógica de trabalho desigual na
*
Pós-doutoranda e professora colaboradora junto ao Departamento Política Científica e Tecnológica
da Unicamp, com bolsa PNPD/CAPES. Correo electrónico: <marcia.tait@gmail.com>
*
* Pós-doutoranda e professora colaboradora junto ao Departamento Política Científica e Tecnológica
da Unicamp, com bolsa PNPD/CAPES. Correo electrónico: <rebecafeltrin@gmail.com>
*
** Doutoranda junto ao Departamento Política Científica e Tecnológica da Unicamp, com bolsa CAPES.
Correo electrónico: <gedalvad25@gmail.com>
2
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academia. Neste sentido, o referencial teórico-metodológico adotado foi ancorado nas
abordagens dos estudos feministas sobre as desigualdades de gênero na sociedade
e na ciência. Após uma contextualização da desigualdade de gênero no Brasil atual,
incluindo o contexto acadêmico, discutiu-se sobre como a reestruturação do trabalho
acadêmico em tempos de pandemia tem impactado de forma distinta as
pesquisadoras, especialmente aquelas que são mães. O artigo termina com reflexões
sobre as potencialidades da crise em promover a ruptura com o paradigma atual,
excludente e produtivista, de produção do conhecimento.
Palavras- chave
MULHERES; CIÊNCIA; DESIGUALDADE; CUIDADO; PANDEMIA DE COVID-19.
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Introdução
A pandemia de COVID-19 tem acelerado diversos processos de mudança na vida
social, cultural e econômica de nossa sociedade. A recomendação da Organização
Mundial da Saúde (OMS) de isolamento social para evitar a propagação da doença é
adotada por diferentes países ao redor do mundo. Entretanto, nos países mais pobres,
tais estratégias preconizadas pela OMS são muitas vezes impossíveis de serem
seguidas por grande parte da população que vive em favelas, casas insalubres,
pequenas e compartilhadas com várias pessoas (Esmili, 2020). Da mesma forma, as
exigências de redobrar a higiene pessoal são distantes da realidade do 37,2% da
população brasileira que possui restrições aos serviços de saneamento básico. O
modelo de trabalho remoto, popularmente chamado de “home office, também é um
luxo em um país como o Brasil, em que 20,1% da população tem restrições de acesso
à Internet (IBGE, 2019), acessando-a majoritariamente pelo celular e utilizando
“pacotes” de dados limitados em termos de quantidade de dados mensais e
velocidade. Além disso, 12,2% da população em idade produtiva está desempregada
e outros 39,9% vive na informalidade.
1
Jasanoff (2020)
analisa como um determinado modelo de saúde foi amplamente
aceito em contextos completamente distintos, tendo suas regras disseminadas tão
rapidamente quanto o próprio vírus. Assim, a partir de uma visão universal da ciência
a qual ignora as particularidades das diferentes realidades e populações os
1
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) este grupo é composto por:
trabalhadores sem carteira incluindo domésticos, empregadores sem Cadastro Nacional da Pessoa
Jurídica (CNPJ), aqueles por conta própria sem CNPJ e trabalhadores familiares auxiliares (IBGE,
2020a).
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conceitos de saúde, bem-estar e modelos de prevenção da COVID-19 elaborados a
partir da visão do Norte global acabam sendo generalizados para o resto do mundo.
Em entrevista Judith Butler
dentro do contexto das abordagens desenvolvidas
por ela sobre o tema da violência, desigualdade e luto analisou como as sociedades
ocidentais modernas de maneira geral definem que apenas algumas vidas são
passíveis de luto e consideradas verdadeiramente humanas, enquanto outras, são
submetidas a violência constante e sofrem uma injustiça radical”. A autora conclui
convocando à uma luta coletiva pela “igualdade radical”. Esses processos produtores
de injustiças ficam mais evidentes em sociedades onde as desigualdades em suas
várias dimensões, que incluem gênero e raça são mais agudas (Butler, 2020).
Podemos dizer que a injustiça radical” no contexto atual de pandemia em países
profundamente desiguais e violentos, como o Brasil, ficou ainda mais visível. Essas
diferenças sociais atingem principalmente populações vulnerabilizadas por processos
de racialização, marginalidade socioeconômica, de genderificação e sexualidades
dissidentes, como a comunidade LGBTQI+.
2
No caso brasileiro é necessário considerarmos que tais desigualdades são
construídas articulando dimensões múltiplas e interrelacionadas, como gênero,
sexualidades, cor/raça e nível socioeconômico. É notório, por exemplo, no estado de
São Paulo, que apresenta 39% dos lares “chefiados” por mulheres principalmente
pretas e pardas e que recebem rendimentos 41% inferiores das famílias chefiadas
2
Os principais impactos da pandemia apontados por membros da comunidade LGBTQI+ brasileira foram
a piora da saúde mental, a desconexão com suas redes de apoio e a falta de dinheiro. Esses fatores
intensificaram a vulnerabilidade física como vítimas de violência, emocional, social e financeira a
qual parte da população LGBTQI+ é historicamente submetida e faz com que essas pessoas sofram
impactos mais significativos na vida e nos meios de subsistência durante a pandemia, intensificando a
exposição as violências e exclusões. (#VoteLGBT+ e BOX1824, 2020; Marsiaj, 2003).
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por homens (SEADE, 2020). No Brasil, o número total de lares chefiados por mulheres
é de 28,5% (Costa, 2018).
Para as mulheres brasileiras, em geral, as preocupações atuais têm ido muito
além do vírus em si. Incluem as dificuldades em conciliar o trabalho com os cuidados
da casa e dos filhos e, para quase um terço delas, em manterem o sustento da família.
O aumento dos casos de violência contra a mulher registrados na maioria dos países
que vivenciam a pandemia também se impõe. Segundo dados da Ouvidoria Nacional
de Direitos Humanos (ONDH), no período de isolamento, os canais de denúncia de
violência de gênero por telefone no Brasil “Disque 100” e “Ligue 180” tiveram um
aumento de 9% no número de ligações recebidas, enquanto o número de denúncias
de violência contra a mulher ocorridas registradas e/ou denunciadas no país
registrou um aumento de 18% (MMFDH, 2020).
Tais questões somam-se ao fato de que as mulheres são as principais
“cuidadoras”, seja de seus pais idosos e de seus filhos ou como trabalhadoras na área
do Care enfermeiras, fisioterapeutas, cuidadoras de idosos, etc. (Guimarães, Hirata
e Sugita, 2011). No Brasil, elas representam 85% dos profissionais da enfermagem
(Machado, 2017), podendo assim estarem mais vulneráveis a contraírem o
coronavírus.
As tensões impostas pela pandemia do coronavírus tornaram constantes as
disputas pelo direito à prevenção/proteção à vida e ao trabalho, expressa no falso
dilema: vida versus economia, que esteve presente em diversos momentos nos meios
de comunicação. Além disso, esse contexto evidenciou quem eram aqueles e,
principalmente, aquelas que deveriam pagar com a sobrecarga de trabalho ou com
exposição ao vírus para dar continuidade à produtividade global.
As desigualdades sociais, a pobreza, o desemprego, que já faziam parte da vida
dos cidadãos e cidadãs brasileiros bem antes da pandemia, foram aprofundadas no
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período recente por políticas neoliberais e de “austeridade”, que retiraram do Estado
a responsabilidade de amparar os mais vulneráveis redução dos direitos trabalhistas,
reforma da previdência, et cetera. Sendo assim, o falso dilema entre preservar a vida
ou a economia, esconde os interesses de elites e grupos historicamente portadores
de privilégios em manterem seus ganhos durante uma crise humanitária e sanitária às
custas dos mais vulneráveis. A necessidade de que os Estados adotem medidas de
proteção social efetivas, como é o caso da renda básica de universal já adotada em
alguns países,
3
tem se mostrado como possibilidades de saídas para minimizar os
riscos e perda de vidas.
Neste contexto, a pandemia nos mostra tamm as fragilidades de nossas
democracias em gestar e implantar políticas mais adequadas para o cuidado comum
e para a manutenção da vida e que possam dar conta da interdependência entre
humanos, bem como, as fragilidades de nossos corpos (Di Cesare, 2020; rez
Orozco, 2014).
4
O olhar das teorias feministas que traremos neste artigo vão,
justamente, afrontar a esse dilema criado pelas economias entre produção versus
3
No Brasil foi implementada pelo governo federal durante o período inicial de três meses o chamado
“auxílio emergencial” no valor de seiscentos ou mil e duzentos reais pagos pelo banco estatal Caixa
Econômica Federal para pessoas já atendidas por programas sociais, microempreendedores
individuais e outros trabalhadores que perderam renda. A medida, recomendada pela ONU (2020)
durante o período, tem sido vista no Brasil como uma forma de “renda básica”, ainda que emergencial
e não universal (Brasil Governo Federal, 2020).
4
Em seu artigo, Donatella Di Cesare coloca os limites e ciladas de uma “democracia imunitária”, que
pode acirrar preconceitos, racismos e controles, justificados pela “fobia do contágio”. Para a autora
existe um ficit de criticidade em relação aos modelos de democracia focando apenas em como
defender ou melhorar que pouco questiona o quanto a maioria deles possui uma forte relação com as
fronteiras, o discurso do medo do outro e de terror ao que é externo (Di Cesare, 2020).
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reprodução/cuidado, que continua sendo reproduzido e determinando as normas e as
formas de organização da sociedade e do trabalho, inclusive, no contexto da produção
científica e carreiras acadêmicas.
A partir do impacto diferenciado da pandemia sobre as mulheres, a proposta
deste artigo é discutir os desafios enfrentados pelas pesquisadoras em especial, as
brasileiras e que exercem a maternidade e cuidados e tamm as potencialidades
trazidas pela crise para realização de mudança em lógicas reprodutoras de
desigualdades na academia.
Vale destacar que as pesquisadoras a qual nos referimos neste artigo estão
alocadas quase que exclusivamente em universidades públicas brasileiras, espaços
que concentram 99% da pesquisa produzidas no país (Cross, Thomson e Sinclair,
2018). Além disso, o perfil apresentado por essas mulheres é composto
majoritariamente por mulheres brancas e não foram encontrados em nossas
pesquisas dados estratificados sobre a população LGBTQI+. Esses dados ou a
ausência deles evidenciam a necessidade da produção de mais levantamentos,
indicadores e estudos para um entendimento das intersecções entre elementos que
geram discriminação e desigualdade entre as mulheres acadêmicas ou penalizam
ainda mais algumas mulheres. No entanto, o serão foco deste artigo em específico.
A discussão que apresentamos no artigo partiu do levantamento e da
sistematização de distintos materiais dados secundários, artigos de opinião,
discursos, relatos de experiência, boletins, notícias que circularam na mídia
especializada e nas comunicações acadêmicas sobre os desafios trazidos pela
pandemia de COVID-19 para a carreira das pesquisadoras, com ênfase no Brasil.
Destacamos que esses formatos alternativos de comunicação e publicação científicas
que compõem parte significativa de nossa fonte de pesquisa ganharam força no
contexto da pandemia e foram adotados por distintas áreas do conhecimento,
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especialmente devido a atualidade do tema e da rapidez com que essas
comunicações circularam incluindo os artigos publicados em preprints,
5
contrapondo-se ao lento fluxo de publicação tradicional. Além disso, como destaca
Kuhn (2003), a ciência em momentos de crises paradigmáticas que o antes de
tudo culturais, sociais se torna mais especulativa.
As desigualdades na academia enfrentadas pelas mulheres, embora venham
sendo debatidas pelo menos desde a cada de 1980, não foram suficientemente
incorporadas pelo meio acadêmico ou traduzidas em políticas ou programas
definitivos para a mitigação dessas desigualdades, por isso, a sua persistência nos
estudos de gênero, nas discussões dentro das instituições de pesquisa, nas mídias
especializadas e na sociedade em geral. Dessa forma, é importante retomarmos essa
questão com todos os novos contornos adquiridos na pandemia, visando subsidiar a
elaboração de ações mais inclusivas na academia, especialmente, a partir do
questionamento dos modelos de trabalho, produção e avaliação do conhecimento.
O artigo é organizado em quatro seções, além da introdução e considerações
finais. A primeira seção apresenta as múltiplas abordagens dos estudos feministas
sobre desigualdades de gênero na sociedade em geral e, em particular, no mundo da
ciência. A seção seguinte apresenta uma breve contextualização da desigualdade de
gênero no Brasil contemporâneo, bem como, as particularidades vivenciadas pelas
5
Preprint se refere a um manuscrito científico depositado em um servidor público de forma prévia à
avaliação por pares e/ou sua publicação em uma revista científica (Packer e Mendonça, 2020). Embora
o preprint já seja utilizado há algumas décadas por áreas específicas, seu uso tem sido ampliado para
outras áreas do conhecimento, sendo acelerado por conta das necessidades de comunicação rápida
na pandemia. O servidor SciELO Preprints foi lançado esse ano, buscando alinhar seu fluxo de
comunicação de pesquisa às práticas da ciência aberta, incluindo transparência, colaboração, além da
rápida e gratuita disseminação do conhecimento científico (Packer e Mendonça, 2020).
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mulheres no ambiente acadêmico. A terceira seção trata sobre a reorganização do
trabalho científico em meio à pandemia, buscando problematizar como a pandemia de
COVID-19 pode afetar de uma maneira distinta a vida das mulheres, especialmente
aquelas que são mães. A quarta seção traz uma discussão, à luz das teorias
feministas, sobre os desafios e potencialidades da crise em promover a ruptura com
o paradigma atual que rege o modelo de produção do conhecimento, o que inclui o
sistema desigual de trabalho e produtividade no meio científico. Por fim, as
considerações finais refletem sobre esses novos caminhos e possibilidades que
podem ser conquistados pelas mulheres acadêmicas a partir da experiência
vivenciada pela pandemia, já que essa crise desnudou os limites e inconsistências do
modelo de mundo em que vivemos, o que inclui o mundo da ciência.
Abordagens feministas das desigualdades nos espaços de
produção da ciência
Diferentes campos de conhecimento como a epistemologia histórica, a sociologia da
ciência e a antropologia da ciência, têm contribuído no sentido de questionar a
“neutralidade” da ciência ao demonstrar que este tipo de conhecimento, assim como
todos os outros, foi construído a partir de um caráter histórico, social e político. Dentro
dessas distintas abordagens das humanidades sobre a ciência, as abordagens críticas
feministas foram as mais radicalmente questionadoras, entendidas aqui como as
epistemologias feministas da ciência, os estudos sociais da ciência e tecnologia e os
estudos feministas da tecnociência. Ainda que com distintos enfoques, os estudos
dentro deste campo têm revelado que o androcentrismo o apenas exclui as
mulheres do mundo da ciência, mas também desempenha papel determinante na
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construção das estruturas, culturas, relações, práticas e conhecimentos produzidos
(Bandeira, 2008; Sardenberg, 2002; Vasconcellos e Tait, 2016).
Parece importante iniciar esse tópico, sendo assertivas em dizer que a
desigualdade e androcentrismo e, por vezes, o machismo presente na sociedade,
tamm estão presentes no mundo da ciência, que esse não é “um mundo à parte”.
Como mostram os estudos de caráter mais históricos e epistemológicos, essas
assimetrias e discriminações estiveram presentes desde o momento de
institucionalização da chamada Ciência Moderna, ainda no século XVII (Schiebinger,
2001). Tosi (1998) analisa que as mulheres, que antes da Revolução Científica tinham
alguma participação na construção do conhecimento mesmo que muitas vezes como
ajudantes de seus pais e maridos, foram excluídas do mundo da ciência a partir de
sua institucionalização. A autora descreve como o conhecimento produzido pelas
mulheres passou a ser negado, contestado e obscurecido. A longevidade dessas
visões sobre o papel social das mulheres nos ajuda a entender o processo histórico-
cultural de construção do atual modelo de ciência androcêntrica e como são
necessárias profundas transformações na produção de conhecimento tecnocientífico
(Sardenberg, 2002).
O feminismo e a Economia feminista, enquanto prática política e reflexiva,
questionam o caráter natural dessas relações desiguais de gênero e a sua construção
e manutenção histórica, envolvendo âmbitos blico e privado (Herrero, 2014;
Piscitelli, 2013; Scott, 1990). Para questionar esses mecanismos, os estudos
feministas colocam em xeque os próprios procedimentos e hipóteses para o
desenvolvimento do conhecimento científico revisando metodologias ou conteúdos
excludentes ou discriminatórios. Diana Maffía (2005) descreve esse funcionamento
em termos de categorias dicotômicas, sexualizadas e hierarquizadas que estruturam
o pensamento científico. As principais dicotomias apontadas por esta autora e por
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outras como Amorós (1985), Keller (1991), Merchant (1989) e Puleo (2011) são:
cultura/natureza; razão/emoção; corpo/mente; rao/emoção; objetivo/subjetivo. O
masculino está sempre associado aos primeiros componentes do par dicotômico,
sendo estes mais valorizados socialmente e considerados eminentemente mais
racionais, enquanto o feminino estaria associado aos componentes hierarquicamente
inferiores. Considerando que a racionalidade e objetividade são as bases da ciência,
logo, as mulheres não seriam suficientemente aptas para a vida científica.
Tamm é importante pontuar que a construção social prevalente em torno das
características e princípios que constituem a ciência considera que a objetividade está
relacionada à neutralidade, entendida como possibilidade de suprimir os valores
sociais, culturais e políticos, além das emoções, sentimentos e paixões. As
epistemologias feministas vão problematizar a objetividade da ciência, colocando
essas características como falaciosas, o que não significa a impossibilidade e
necessidade de adoção de outros critérios de objetividade para a produção do
conhecimento científico (Haraway 1995; Harding, 1998; Maffía 2005, 2007). Como
salienta Bandeira (2008), uma das especificidades da crítica feminista à ciência é
justamente tematizar a ausência das mulheres na história em geral e na história da
ciência, bem como a consequente associação entre masculinidade e pensamento
científico.
Dentro das teorias feministas sobre a produção de conhecimento, a aposta
teórico-metodológica de corporificar/situar a produção de conhecimentos científicos
foi uma das estratégias mais rteis no caminho de desenhos possíveis para uma
multiplicidade de ciências feministas que buscam romper com elementos
androcêntricos e etnocêntricos da ciência hegemônica. Essas abordagens
aprofundaram a análise da não universalidade da ciência e androcentrismo científico
e propuseram alargar esse olhar a partir de pontos de vistas subalternizados,
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racializados, que também escapavam aos vieses heteropatriarcal e branco (Espinosa-
Miñoso 2010; Espinosa-Miñoso, Gómez e Ochoa, 2014; Tait, 2017; Tait e Gitahy,
2019).
Os feminismos situados, assim como a interseccionalidade,
6
parecem
abordagens especialmente relevantes para entender o contexto de produção de
conhecimento científico e social com todas as suas desigualdades, ao trabalhar de
forma conjunta diversos marcadores sociais de diferença: nacionalidade, posição
socioeconômica, identidade étnico-racial, gênero e sexualidades, idade, entre outros
(Bilge, 2009; Curiel, 2007; Espinosa-Miñoso, 2010; Espinosa-Miñoso, mez e
Ochoa, 2014; Hill Collins, 1991). Os feminismos situados e interseccionais visam
apreender a complexidade das identidades e das desigualdades sociais por
intermédio de um enfoque integrado que questiona o enclausuramento e a
hierarquização dos grandes eixos da diferenciação social (Bilge, 2009). Ambas as
perspectivas contribuem para alargar o entendimento dos diferentes contextos e
corpos presentes na produção da ciência e no próprio feminismo.
Este conjunto de abordagens feministas nos ajudam a compreender não apenas
como as mulheres, mas tamm como mulheres de determinados países, origem e
condições sociais e étnico-raciais específicas, foram em distintos graus
sistematicamente excluídas do mundo e das próprias estruturas e organização do
trabalho acadêmico-científico. Esse entendimento, também nos ajuda a evidenciar
formas pelas quais as mulheres podem atuar enquanto sujeitos coletivos
6
A interseccionalidade, como categoria analítica, surgiu da produção intelectual e política dos
feminismos negros norte-americanos. O termo foi criado originalmente por Kimberlé Crenshaw em 1989
para descrever as múltiplas opressões sofridas pelas mulheres por sua etnia/raça/classe. As análises
interseccionais tiveram ainda contribuições importantes de outras autoras, como por exemplo, Bell
Hooks, Patricia Hill Collins, Margaret Adersen, Chandra Mohanty, Lélia Gonzalez (Portocarrero, 2013).
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heterogêneos, inclusive na produção de conhecimento e de metodologias e
referenciais científicos a partir de posicionamentos epistemológicos não hegemônicos
ou produzidos nas margens (Bandeira, 2008; Haraway, 1995).
Por último, uma discussão dos estudos feministas que gostaríamos de retomar
versa sobre a relação entre esfera produtiva e reprodutiva, a qual irá nortear nossa
análise sobre como o trabalho científico é influenciado, ou melhor, tamm
dependente, dessa dimensão que continua deixada à margem das análises e
políticas. Essa dimensão reprodutiva e de cuidados se tornou mais evidente durante
a pandemia, reforçando a tendência de sobrecarga de trabalho feminino.
7
A divisão
desigual de trabalhos entre homens e mulheres talvez seja uma das dimensões mais
concretas e persistentes dentre as diversas relações desiguais de gênero e fazem
parte de um longo histórico constituinte das próprias relações sociais de gênero e
discutido dentro das teorias feministas.
Algumas autoras analisam essas desigualdades em termos macroestruturais
como consequências da articulação entre o patriarcado e o capitalismo (Mies, 1998).
Os estudos da Economia Feminista propõem esmiuçar a divisão sexual do trabalho e
a hierarquização baseada no sexo/gênero. Essa divisão acontece tanto em âmbito
doméstico divisão nos lares ou pela contratação outras mulheres para realizar essas
atividades quanto no “mercado”, com áreas de atuão profissional e atividades
ocupadas predominantemente por homens ou mulheres. Em ambos os casos, os
estudos evidenciam os privilégios dos homens em relação às mulheres.
7
Em geral, as mulheres brasileiras dedicam 73% horas a mais aos cuidados e/ou afazeres domésticos
do que os homens. Com recorte de raça ou cor, as mulheres as pretas e pardas são as que dedicam
mais horas para execução de tais tarefas. Por outro lado, entre os homens tal recorte não implica em
uma variação considevel do índice (IBGE, 2018a).
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Os estudos econômicos feministas partem da ressignificação do próprio conceito
de trabalho e economia, inserindo a esfera reprodutiva como parte da economia e
fator decisivo para a sustentabilidade da vida humana. A economia é entendida como
uma esfera ampliada, que não se resume ao mercado e envolve um conjunto de
relações e mecanismos que funcionam juntos, para manutenção do sistema capitalista
no atual momento histórico e configuração e da vida (Carrasco, 2014; Faria e
Moreno, 2012; Freitas e Silveira, 2007; Grecco, Furno e Teixeira, 2018; Picchio, 2012).
A manutenção ou reprodução da vida são sustentadas nas tarefas de cuidados
cotidianos, como: cozinhar, lavar a louça e a roupa, cuidados com a saúde humana,
além da promoção do próprio bem-estar subjetivo que englobam expressões como o
carinho, a criatividade, as relações afetivas e amorosas, o cuidado com a natureza e
o bem-estar animal, etcétera.
O que permanece oculto na sociedade atual, como sublinhou Carrasco (2003),
não é apenas o trabalho doméstico e reprodutivo, mas sua função de pilar para
manutenção do sistema de produção capitalista, que segue ideologicamente baseado
num irreal homo economicus, que seria capaz de dedicar a maioria do seu tempo ao
mercado de trabalho. Outro aspecto ressaltado nesta abordagem, mais evidente na
pandemia, é uma mundial e progressiva crise dos cuidados. Amaia Pérez Orozco,
tomando a situação na Espanha, analisa o momento atual de crise sistêmica como de
transição e que abre brechas para colocar em xeque os tradicionais modelos desiguais
e suas implicações de gênero e para divisão de tarefas de cuidado e de
sustentabilidade da vida (Pérez Orozco, 2014).
Atendo-nos a esse conjunto de contribuições de diferentes autoras e abordagens
do pensamento feminista, nos aproximamos no próximo item de um conjunto de dados
atuais que consideramos importantes para desenhar um panorama, mesmo que
provisório, dos impasses que envolvem os modos de vida e trabalho das mulheres
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brasileiras, em especial das mulheres cientistas, em tempos de pandemia da COVID-
19. A partir dos dados selecionados buscaremos estabelecer alguns parâmetros
concretos das desigualdades de gênero no contexto acadêmico brasileiro recente.
Trabalho e gênero na carreira acadêmica
As políticas públicas inclusivas têm promovido mudanças no perfil dos estudantes no
ensino superior brasileiro,
8
que pode ser observado a partir do aumento no número de
estudantes oriundos de escolas públicas; autodeclarados pretos, pardos e indígenas;
com algum tipo de deficiência; e do sexo feminino na composição do corpo discente
(Andifes, 2018).
No ensino superior, as mulheres representam 57,2% dos estudantes
matriculados e são maioria também entre os estudantes de pós-graduação,
correspondendo a 56,3% dos doutorandos e 52,1% dos mestrandos (INEP, 2018,
2019).
O Brasil figura como o país que mais avançou em termos de igualdade numérica
de gênero na academia, considerando as duas últimas décadas. As mulheres
representam 49% da população de cientistas o que coloca o país, junto com Portugal,
no primeiro lugar mundial em igualdade de gênero na ciência. O número de mulheres
inovadoras no Brasil também cresceu, nos últimos anos, elas respondem por 19% dos
pedidos de patente, um percentual superior ao observado em países como Japão
8%, Reino Unido 12% e Austrália 12% (Elsevier, 2017).
8
Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais Brasileiras
REUNI (2007), Sistema de Seleção Unificado SISU (2010), Programa Nacional de Assistência
Estudantil PNAES (2010), Lei de Cotas nº 12.711/2012, e Lei 13.409/2016 que inclui pessoas com
deficiência ao sistema de cotas.
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Entretanto, quando analisamos a situação das mulheres brasileiras na academia
a partir da ótica interseccional, percebemos nuances de desigualdades. O percentual
de mulheres brancas, com 25 anos ou mais, com ensino superior completo é de
23,5%, enquanto entre mulheres negras e pardas esse percentual é de 10,4%. Entre
homens brancos com a mesma faixa etária, o percentual é de 20,7%, enquanto entre
homens pretos e pardos, os que cursaram o ensino superior representam apenas 7%.
Embora as mulheres, como categoria geral, tenham maior acesso ao ensino superior,
ao olharmos para cor ou raça é inegável o impacto deste fator no acesso à educação
(IBGE, 2019).
No universo da pesquisa, percebemos uma enorme sub-representação de pretos
e pardos na função de docentes/pesquisadores no Brasil. Tomando como exemplo as
duas principais universidades que fazem pesquisa no país, temos a Universidade de
São Paulo (USP) com apenas 2,2% de seu corpo docente composto por pretos ou
pardos (Souza, 2018) e a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) com
somente 0,53% dos docentes autodeclarados pretos (Inada, 2018). Se considerarmos
em nossa análise os marcadores de gênero e raça, apenas 0,4% dos docentes da
pós-graduação no Brasil são de mulheres negras (Carmona, 2018). Se as mulheres
brancas que representam a grande maioria das pesquisadoras brasileiras
enfrentam dificuldades na carreira acadêmica, para as mulheres pretas e pardas os
desafios são provavelmente ainda maiores.
Mesmo com dados favoráveis sobre a participação das mulheres no ensino
superior e no universo da pesquisa científica, independentemente do nível e área de
formação/atuação profissional, elas continuam tendo dificuldades para ascender
profissionalmente e enfrentam desigualdades salariais em relação aos homens. Nos
países membros e parceiros, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OECD), em qualquer campo de estudo, os ganhos das mulheres são
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inferiores aos dos homens. Mesmo com o mesmo grau de instrução, a progressão
feminina na carreira é limitada por diversos fatores de ordem social e econômica
(OECD, 2020).
Segundo os dados do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) de 2016, as mulheres representavam 46,6% dos líderes de grupos
de pesquisa, mesmo sendo maioria entre os pesquisadores doutores no país. Na
Academia Brasileira de Ciências (ABC), as mulheres correspondem a apenas 33% dos
membros titulares. Nas universidades federais, as mulheres representam 30% dos
reitores e 34% dos Vice-reitores (Ambrosini, 2017).
A sub-representação das mulheres nos cargos de maior prestígio e rendimento
é recorrente também nos campos “tradicionalmente femininos”, mantendo a tendência
denominada na literatura de gênero de “segregação horizontal”. Elas são a grande
maioria na área de educação: a força de trabalho feminina representa 95% dos
docentes da educação infantil, 59% no ensino médio e apenas 46% no ensino
superior. Em 2020, de acordo com dados do CNPq, pesquisadores do sexo masculino
recebem 62% das bolsas de produtividade em pesquisa nível sênior em vigência
oferecidas pela agência de fomento para a área da educação (CNPq, 2020).
O conjunto de dados aqui apresentados evidenciam uma sub-representação
feminina que se acentua com a ascendência na carreira: em outras palavras, as
mulheres passam a ser minoria no mundo da ciência quando consideramos as
posições de liderança, diretorias, reitorias, etc. Esses dados mostram uma tendência
já apontada em estudos anteriores, expressas nos conceitos denominados “teto de
vidro”, “segregação vertical” ou “labirinto de cristal” (Lima, 2013; Tait, 2017). A seguir
apresentamos alguns dos impactos da pandemia, até então identificados, na atividade
das mulheres acadêmicas.
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A reorganização do trabalho científico durante a pandemia
O teletrabalho e o home office mostraram-se alternativas viáveis para algumas
atividades frente à imposição de distanciamento social, passando a fazer parte da vida
de milhões de brasileiros.
9
Só no mês de julho, 12,7% das pessoas ocupadas no país
estavam exercendo atividade de maneira remota (Góes, Martins e Nascimento,
2020b). Isso repercutiu na reconfiguração e ampliação de processos em curso que
transformaram a casa dos trabalhadores e trabalhadoras em escritórios e salas de
aula, um fenômeno de rápida expansão do modelo de home office, acompanhado por
uma tendência específica da produção de conhecimento científico que demanda uma
carga de trabalho que extrapola o horário a ser cumprido dentro da instituição por
apresentar demandas contínuas (Boueri e Assis, 2018).
Conforme argumenta Almeida, o modelo de teletrabalho trouxe mudanças
significativas em nossa vida cotidianas, impondo uma indistinção ou sobreposição
entre as esferas públicas e privadas, tendo em vista que “o teletrabalho deslocou os
espaços de produção o escritório, o laboratório, a escola etc. para dentro de casa”
(Almeida, 2020: s/n), tornando-as unidades produtivas. O autor afirma que não se trata
de apenas compartilhar o espaço da casa com o trabalho, “mas efetivamente de sua
colonização pelas forças produtivas, que finalmente passam a ter o controle integral
da vida” (Almeida, 2020: s/n).
O enfoque econômico feminista oferece elementos que nos ajudam a entender
os desdobramentos de um avanço do trabalho remoto realizado em casa durante a
9
O potencial de teletrabalho varia, a depender das características das atividades, aquelas com maior
potencial teletrabalho o as dos grupos de “Profissionais das ciências e intelectuais” “Diretores e
Gerentes” (Góes, Martins e Nascimento, 2020a).
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pandemia. Essa modalidade de trabalho tende a borrar as fronteiras entre o produtivo
e reprodutivo e o público e privado, de uma maneira que acentua a sobrecarga sobre
as mulheres que realizam o “home office”, como é o caso da quase totalidade das
mulheres pesquisadoras durante a pandemia.
Ao analisar as transformações que marcaram a transição de um modelo de
trabalho “fabril” para um de “escritórios” e de caráter flexível, autores como Barbrook
(1999) e Terranova (2000) apontam que tais mudanças trouxeram uma intensificação
dos ritmos e a exigência de novos tipos de habilidades laborais, que incluem o uso do
tempo para adquirir habilidades ou realizar aprendizados que se dão, muitas vezes,
de forma não remunerada por exemplo, atividades de aprendizagem e uso de
tecnologias e a produção de conhecimentos e conteúdos”. A própria sustentabilidade
da rede mundial de computadores World Wide Web desde seu surgimento
dependeria, segundo esses autores, de enormes quantidades de trabalho gratuito e
invisível. Essas relações permitem um paralelo interessante com os trabalhos
reprodutivos e de cuidado que sustentam a “rede” de relações sociais no mundo “on
e “offline” e também é comumente invisível e não remunerado.
As atividades de pesquisa e de docência na s-graduação sempre foram
intensivas em conhecimento e dependeram da pesquisa e aprimoramento e,
contemporaneamente, da mediação das tecnologias de comunicação e informação.
Entretanto, o trabalho remoto nos moldes atuais, segundo os depoimentos de
mulheres e mães pesquisadoras analisadas neste artigo, vêm provocando a
sobreposição entre ao menos duas formas de trabalhos não remunerados: o
reprodutivo trabalhos domésticos, cuidados e manutenção da vida e o de
aprendizado e produção cultural. Isso amplia a sobrecarga de estresse gerada por
essa sobreposição de “tempo-espaços” produtivos e o produtivos, remunerados e
não remunerados, e por uma redução dos “tempos-espaços” de ócio e de descanso.
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Em geral, mesmo antes da pandemia, as mães pesquisadoras sinalizavam
que não conseguiam desenvolver parte significativa do trabalho científico em suas
casas, tendo em vista a necessidade de ampla concentração por várias horas
seguidas, o que é dificilmente alcançado quando se é a principal ou única
responsável pelo cuidado dos filhos. Um levantamento realizado pelo Parent in
Science, em 2017, revelou que para 54% dos respondentes com filhos, a mãe era a
principal cuidadora, enquanto em 34% dos casos o cuidado era dividido entre os pais,
7% dos pesquisadores contavam com ajuda de terceiros familiares, amigos, babás
e 5% responderam que o pai assumia a responsabilidade de cuidado com o(s) filho(s)
apenas ocasionalmente (Machado et al., 2019).
O impacto dessa distribuição desigual do trabalho de cuidado na carreira das
mulheres se traduz em uma diminuição da produtividade e do tempo disponível para
o trabalho científico no âmbito doméstico: apenas 14% das pesquisadoras mães
responderam que seu desempenho não é afetado quando realizado em casa, 20%
das pesquisadoras afirmam conseguir executar apenas tarefas simples ligação
telefônica, escrever um e-mail, etc., mas que era impossível realizar tarefas mais
complexas escrever artigos, pareceres, etc.; 21% disseram que só são capazes de
realizar tarefas complexas depois que os filhos dormem geralmente de madrugada
(Machado et al., 2019).
O trabalho remoto durante a fase de isolamento social ganhou novos contornos
nada favoráveis às pesquisadoras, especialmente àquelas com filhos frente a
intensificação das atividades de cuidado no âmbito doméstico decorrentes da
interruão de serviços especializados, como serviços contratados de cuidado e
limpeza doméstica, de educação básica, ou da perda de modalidades, como as redes
de apoio. No caso das acadêmicas, tais dificuldades se somam às pressões de manter
integralmente seus índices de produtividade e sua rotina de trabalho no plano remoto,
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já que participam de um ambiente altamente competitivo (ADUSP, 2020). Em
entrevistas concedidas por docentes da USP, publicadas no Informativo ADUSP, foram
reveladas algumas das dificuldades de trabalho das pesquisadoras durante a crise
atual. A máxima repetida por muitos acadêmicos e estudantes de que “a USP não pode
parar” desconsiderava a realidade e particularidades da vida de muitos que fugiam ao
padrão esperado de cientista aquele que se dedica integralmente ao trabalho e não
tem compromissos de cuidado com outros, o que tem se transformado em uma
enorme pressão à esses grupos, especialmente às mulheres cientistas ou estudantes
que são mães (ADUSP, 2020).
De acordo com a pesquisa realizada pelo grupo Parent in Science durante o
período de isolamento social, desigualdades no desempenho do trabalho
acadêmico remoto realizado por homens e mulheres em geral, sendo que isso se
agrava ainda mais quando consideramos a questão da maternidade. Segundo os
dados coletados entre 1 e 8 de abril, envolvendo 4.261 estudantes de pós-graduação,
44% dos homens sem filhos estão conseguindo trabalhar remotamente, contra 37%
das mulheres sem filhos. Dos homens com filhos, 20% conseguem trabalhar
remotamente no período (Parent in Science, 2020a), enquanto entre as mulheres com
filhos apenas esse percentual é de 13% (Parent in Science, 2020b). Os resultados da
pesquisa reforçam que as dificuldades enfrentadas por mulheres com ou sem filhos
com agravo para aquelas com filhos na academia são maiores do que aquelas
enfrentadas por homens com filhos ou por seus pares sem filhos. A pesquisa revela a
necessidade de flexibilizar e prorrogar os prazos de defesa e vigência das bolsas,
que o trabalho remoto está afetando significativamente o trabalho de alguns grupos
(Staniscuaski et al., 2020).
Neste primeiro momento, o impacto dos novos arranjos na produtividade das
pesquisadoras pode ser evidenciado pela redução das submissões de artigos
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acadêmicos assinados por mulheres. Editores de importantes revistas científicas têm
demonstrado preocupação diante da discrepância observada na submissão de artigos
por homens e mulheres durante o período de isolamento. A editora do British Journal
for Philosophy of Science, Elizabeth Hannon, revelou em sua conta no Twitter que a
revista praticamente não recebeu artigos assinados por mulheres em abril de 2020, e
manifestou preocupação com o desempenho das pesquisadoras, que muitas
indicaram ser necessário abandonar seus projetos nesse momento. Algumas
respostas de acadêmicas à postagem de Hannon tamm destacam as dificuldades
das mulheres com filhos, já que as escolas estão fechadas e elas, como principais
cuidadoras, não estavam conseguindo se dedicar ao trabalho (Fazackerley, 2020).
Por outro lado, a publicação de homens parece ter crescido nesse mesmo
período. De acordo com David Samuels, coeditor da Comparative Political Studies, as
submissões de artigos à revista terem crescido quase 50% no mês de abril,
comparado ao mesmo período no ano passado, todavia, esse aumento foi
inteiramente impulsionado por homens (Fazackerley, 2020).
Esses padrões têm se repetido em algumas revistas brasileiras. No início de
2020, as mulheres respondiam por 40% dos artigos submetidos à revista Dados (IESP-
UERJ), mas no período de isolamento social esse percentual caiu para 28%. Além
disso, 37% dos artigos no período entre 2016 e o primeiro trimestre de 2020 tinham
mulheres como primeiras autoras, mas no segundo trimestre de 2020 esse percentual
caiu para 13% (De Pierro, 2020).
Para compreendermos muitas dessas dificuldades enfrentadas pelas mulheres
em se manterem produtivas a partir de padrões e ritmos ditados, em geral, por
pesquisadores homens, precisamos refletir sobre o sistema tradicional de produção e
avalião científica, o qual impacta diretamente na distribuição de cargos, prestígio e
recursos entre os pesquisadores.
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A publicação é parte importante do processo de produção do conhecimento
científico e tem por objetivo promover a circulação desse conhecimento entre a
comunidade acadêmica, além de alcançar sua validação e reconhecimento pelos
pares (Barreto, 2013; Camargo Jr., 2013; Velho, 1997). Entretanto, o sistema de
avalião da produção do conhecimento tem utilizado fortemente a quantidade de
publicações científica e citações por ele recebidas como sinônimo de qualidade do
trabalho do pesquisador. Esse modelo de avaliação produtivista gera enormes
distorções no comportamento dos cientistas para a atenderem uma demanda por
artigos cada vez maior para continuarem a receber financiamento por suas pesquisas
(Camargo Jr., 2013). Assim, a avaliação da C&T pautada no produtivismo e na
meritocracia, se transformou em um método de ranqueamento de pessoas, periódicos
e instituições, incidindo sobre a alocação de recursos pelas agências (Barreto, 2013).
O conceito elaborado por Merton (1968), chamado de efeito Mateus, refere-se a
ideia de quanto mais fama e reconhecimento um pesquisador tiver, maior será o
crédito por seu trabalho e, consequentemente, terá maiores incentivos financeiros
para continuar trabalhando. Quando analisamos esse fenômeno pela perspectiva de
gênero, as mulheres muitas vezes são omitidas de publicações científicas em que
participam, seus trabalhos tendem a ser mais criticados pelos pares, são menos
citadas que seus colegas homens, e têm o reconhecimento pela cooperação nos
trabalhos diminuído, o que foi caracterizado por Margaret Rossiter como Efeito Matilda
(Rossiter, 1993). Tais fatores acabam aumentando a desvantagem das mulheres na
produção acadêmica, refletindo diretamente em seu reconhecimento, no
financiamento de suas pesquisas e na ocupação de cargos de liderança.
Outros elementos, que envolvem a distribuição de funções dentro da academia,
contribuem para a sobrecarga das mulheres pesquisadoras durante a pandemia,
conforme apontados por Malisch et al. (2020). Segundo as autoras, há uma tendência
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na academia de as mulheres ocuparem mais cargos administrativos, possuírem maior
carga horária de aulas e realizarem mais cursos de formação e aconselhamento de
estudantes e atividades voltadas à inclusão (Malisch et al., 2020). Essas últimas
atividades representam uma carga emocional extra que envolve o atendimento aos
estudantes em momentos de estresse, conflitos ou crises.
As sobrecargas específicas da vida acadêmica, como o trabalho contínuo que
extrapola o horário a ser cumprido dentro da instituição (Boueri e Assis, 2018), vêm
mostrando suas dimensões de desgaste mental devido à falta de tempo para
atividades familiares, de lazer e “desconexão”. Esse ritmo cotidiano está sendo
relacionado ao aumento dos níveis de sofrimento psíquico entre os pesquisadores e
pesquisadoras (Evans et al., 2018; Maia e Dias, 2020). Podemos observar ainda uma
intensificação da exploração do trabalho intelectual, criativo e, muitas vezes invisível,
que sustenta o trabalho virtual (Barbrook, 1999) e não sabemos quais os
desdobramentos dessas relações após a pandemia.
Pós-pandemia: novos caminhos possíveis para as mulheres
na ciência?
Ao longo dos últimos anos, as mulheres têm se inserido cada vez mais no mercado
de trabalho e contribuído para alterar a lógica implícita ao modelo tradicional de
“homem-provedor e mulher dona-de-casanormalizado socialmente. Mesmo assim,
como ressalta Carrasco (2003), até hoje as estruturas sociais e relações estabelecidas
em seu interior permanecem praticamente inalteradas.
A participação ainda minoritária dos homens nas atividades de cuidado e
reprodutivas mostra a persistência desta sobrecarga de “trabalho invisível” que incide
sobre as mulheres. A responsabilização das mulheres e do espaço privado com a
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gestão da vida e dos cuidados, segundo a literatura da Economia Feminista, é
extremamente útil à manutenção de altas cargas horárias laborais no mercado de
trabalho e, por sua vez, ajuda a explicar porque os homens se inserem no mercado
com vantagem. Antonella Picchio (2012), destaca que a quantidade de trabalho
reprodutivo e não remunerado necessário para manter a sociedade na qual vivemos,
é superior à de trabalho produtivo feito por mulheres e homens no âmbito do mercado.
Propõe a metáfora de um iceberg: as atividades consideradas produtivas seriam a
ponta visível e as reprodutivas toda a parte maior e submersa.
Por isso, na análise de Picchio, do ponto de vista da justiça, equidade social e
de gênero, deve-se “promover uma mudança nas relações e nas regras fundamentais
que estruturam o mercado de trabalho [...] e isso significa uma mudança na própria
estrutura do sistema capitalista” (Picchio, 2012: 20). Essas indagações e
considerações nos ajudam a perceber que mesmo diante de reivindicações e
conquistas de tempos recentes, persiste uma negligência social e política da
responsabilização coletiva sobre os processos de trabalhos necessários para a
manutenção das próprias sociedades humanas (Carrasco, 2014; Herrero, 2014;
Marimon e Tait, 2019; Tait e Jesus, 2016).
Diante dos desafios específicos das mulheres que têm sua vida e trabalho
imersos na pesquisa cienfica, cabe finalmente refletir sobre como poderíamos
transformar as estruturas, os mecanismos e os valores que geram e perpetuam as
diferentes desigualdades de gênero abordadas neste artigo. Colocando em termos
das teorias críticas feministas à ciência: Como produzir formas de organização e
produção de conhecimentos científicos, inovações e tecnologias que não sejam
apenas sobre mulheres, mas que tenham relevância às mulheres e incidam
objetivamente nessas inequidades? (Sardenberg, 2010; Vasconcellos e Tait, 2016).
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As contribuições feministas responderam parcialmente a essa pergunta,
mostrando a necessidade de formulação de políticas de acesso, permanência e
progressão profissional na universidade em suas diversas áreas e segmentos para
mulheres e outros grupos sociais historicamente marginalizados. Também colocam a
urgência de mudanças mais profundas nas próprias formas de organizar, gerir e
produzir os conhecimentos, por exemplo, considerando a parcialidade dos mesmos
não neutralidade, as dimensões éticas, de cuidado e a mudança de lógicas que,
ainda que sejam pretensamente “objetivas”, se mantém excludentes. A perpetuação
de lógicas rígidas de gestão das instituições e critérios de produtividade penalizam as
mulheres e a maternidade, desconsiderando o trabalho necessário para gestão dos
lares e famílias.
Uma importante rota para transformação discutida neste artigo é o enfoque da
Economia Feminista, que propõe a reorientação das atividades produtivas e das
relações sociais para sustentabilidade da vida (Carrasco, 2003; Pérez Orozco, 2014)
tendo como base a lógica de cuidados e as novas configurões para tempos e
espaços. Essa lógica nos desafia a encarar o conflito entre capital e vida ou capital e
cuidados para, em seguida, buscar alternativas que coloquem esse cuidado com eixo
central da vida econômica e social. Dentre as alternativas apontadas estão as que
reorganizam o trabalho reprodutivo e doméstico nas sociedades, nas comunidades,
nos bairros e nos ambientes de trabalho. Concretamente vão de ações como: mais
creches e serviços de atenção a idosos e vulneráveis; políticas de jornadas de trabalho
e remuneração específicas para homens e mulheres que estão em posição de
“cuidadores”; estruturas urbanas de circulação e acolhimento para atividades
reprodutivas; renda básica universal; organizações de cuidado vicinal e comunitário
compartilhada; redução geral nas jornadas de trabalho; entre outras.
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Todas essas medidas, obviamente, teriam impactos tamm na vida das
mulheres pesquisadoras e exigem ajustes específicos em estruturas, formas de
organização e avaliação do trabalho nas universidades e instituições de pesquisa.
Como fazer isso? Primeiro, tendo clareza dessa necessidade, discutindo
coletivamente impactos e ações e se comprometendo a implementar
estrategicamente tais mudanças.
No artigo In the wake of COVID-19, academia needs new solutions to ensure
gender equity” (Malisch et al., 2020), escrito por 17 pesquisadoras de diferentes
universidades norte-americanas, as autoras trazem algumas propostas e caminhos,
tais como: realização de pesquisas que permitam dimensionar o impacto da pandemia
para as mulheres e outros grupos minoritários; responder a realidade encontrada
dentro dos planos estratégicos das instituições visando transformar critérios de
avalião de produtividade e “accountability”. Essas reflexões e ações, ressaltam as
autoras, devem ter como base uma “conversa honesta” sobre o funcionamento das
universidades durante a pandemia e seus impactos, considerando as desigualdades
de gênero como eixo central dos “comitês de avaliação”.
Na mesma direção, a Carta Aberta do movimento Parent in Science, publicada
na Revista Science em maio de 2020, alertou as instituições de pesquisa e órgãos de
financiamento científico sobre as dificuldades enfrentadas pelas mulheres
pesquisadoras em tempos de pandemia e sugeriu a adoção de “boas práticas” para
que o ambiente acadêmico seja mais inclusivo e atenda à realidade das mães-
pesquisadoras (Staniscuaski et al., 2020). As autoras reforçam a necessidade de se
criar políticas e ações que mitiguem os impactos da maternidade, especialmente no
contexto atual, como a criação de programas de concessão de financiamento
projetados para atender à realidade de acadêmicos com filhos. Dessa forma, os
benefícios decorrentes da flexibilização das políticas poderiam estender-se a toda a
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comunidade acadêmica e poderiam contribuir para “tornar a ciência mais justa para
todos os afetados pela pandemia” (Staniscuaski et al., 2020: 724).
Tamm buscando contribuir com a mudança no modelo de trabalho acadêmico,
que exclui as especificidades da vida das mães, três mães-pesquisadoras e
coordenadoras do Blog Mama an Academic elaboraram uma lista de recomendações
às instituições científicas (Leventon, Roetich e Middlemiss, 2019). A partir de suas
experiências pessoais, elas apontam estratégias simples e concretas desde a
flexibilização e redistribuição de trabalho pós-licença maternidade, a apoio e
acolhimento em conferências científicas para mães-pesquisadoras.
10
Observando o período crítico em que estamos vivendo, onde essas questões se
agravam, é ainda mais urgente pensarmos em maneiras de avaliação que considerem
as particularidades e diversidades da vida dos pesquisadores, não esperando que
todos tenham a mesma produtividade. A diversidade deve ser urgentemente
contemplada nas avaliações e distribuição de trabalho e que o momento da pandemia
seja propício para pensarmos estratégias institucionais que corrijam as distorções e
que possibilitem que o mundo da ciência seja mais democrático e inclusivo (Barbosa
e Staniscuaski, 2020).
É fato que o contexto de crise atual deu maior visibilidade às inúmeras
desigualdades no meio acadêmico e tamm às limitações de nossos sistemas de
produção e avalião científicas, o que pode ser considerado um grande avanço rumo
à igualdade de condições na academia. Conforme sinalizam Castro e Chaguri (2020),
devemos buscar uma profunda e criteriosa revisão das normas/valores, estruturas e
relações que incluam o fazer científico e suas implicações para as mulheres.
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A lista completa foi traduzida e reproduzida no artigo de Pontes et.al. (2019).
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O potencial de transformação do momento atual, nos remete a alise de
Thomas Kuhn em seu célebre A Estrutura das Revoluções Científicas (Kuhn, 2003).
Para o autor, a ciência se transforma substancialmente apenas quando crises e
conflitos de ordem cultural e valorativa antes que de ordem lógica ou epistêmica
atingem um alto grau e é capaz de conquistar corações e mentes e suplantar o
paradigma até então dominante (Bandeira, 2008; Kuhn, 2003). A crise de paradigmas
científicos são momentos que poderiam ampliar as possibilidades de repensar
estratégias, proposições epistêmicas consolidadas e as relações de poder (Bandeira,
2008).
Neste sentido, conforme discutimos no decorrer deste artigo, é possível observar
tendências aceleradas pela pandemia de mudanças de processos internos de
funcionamento da ciência, os quais podem alavancar uma ruptura paradigmática nos
modelos de produção e avaliação da C&T. Assim, essa fase “revolucionária” da ciência
(Kuhn, 2003) pode servir como uma oportunidade de transformação profunda na
organização e dinâmica de produção científicas. No entanto, como sugere Kuhn, o
estabelecimento de um novo paradigma depende de negociação e tal mudança não
ocorrerá sem a articulação e mobilização dos atores que foram excluídos e silenciados
na construção do paradigma vigente.
Reflexões finais
As mulheres acadêmicas, embora possam ser consideradas privilegiadas quando
comparadas à grande maioria da população feminina brasileira, também enfrentam
desigualdades decorrentes das normas de gênero em suas vidas e carreiras. A
construção da carreira científica, pautada no produtivismo e na meritocracia, acaba
gerando um ambiente hostil e competitivo que desconsidera as particularidades na
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vida dos pesquisadores e pesquisadoras. A crise atual deu maior visibilidade às
desigualdades vivenciadas pelas mulheres no meio acadêmico e às limitações de
nossos sistemas de produção e avaliação científicas, o que pode impulsionar avanços
rumo à igualdade de condições na academia.
O artigo buscou contribuir para o entendimento dessas desigualdades históricas
à luz do contexto atual de trabalho de pesquisadoras brasileiras que vivenciam a
pandemia. Para isso, partimos de um contexto mais amplo, baseado no levantamento,
sistematização e análise de dados, relatos, opiniões, informativos, artigos e materiais
diversos que circularam recentemente na mídia especializada e meios acadêmicos. A
análise foi ancorada nas contribuições de algumas vertentes da práxis feminista:
economia feminista, estudos sobre os cuidados, interseccionalidades, além da crítica
feminista à ciência, alinhada ao campo dos estudos sociais da ciência e tecnologia.
No decorrer das seções do artigo trabalhamos três pontos que consideramos
centrais, por impactarem diretamente no modo como as pesquisadoras acadêmicas
têm vivenciado a pandemia: 1) a feminilização e invisibilidade do trabalho reprodutivo
e de cuidados que penalizam as mulheres, de forma geral, e tamm as acadêmicas,
com uma maior carga laboral total. Isso repercute na trajetória profissional das
mulheres, seja na desigualdade de condições de trabalho, oportunidades e/ou
dificuldades de ascensão profissional, ou mesmo na redução da qualidade de vida; 2)
o trabalho remoto durante a pandemia e sua relação com a sobrecarga de trabalho
acadêmico para mulheres, especialmente para as mães, com a amplificação da
sobreposição entre espaços-tempos e trabalhos; 3) o produtivismo acadêmico e a
importância conferida a produção de artigos científicos nos critérios de avaliação;
ressaltando que um ambiente competitivo baseado na meritocracia, longas jornadas
laborais, como um modelo tipicamente masculino que desconsidera a dimensão
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reprodutiva. Adicionalmente, sinalizamos para possíveis transformações nos modelos
de produção e avaliação durante a pandemia.
Adotamos a dimensão do trabalho como um fio condutor para mostrar como os
três pontos ressaltados engendram de forma bastante concreta um contexto de
agravamento das desigualdades de gênero. A conciliação das atividades domésticas
e cuidados com filhos com o modelo de trabalho remoto sobrepõe os espaços públicos
e privados e exige o atendimento de demandas contínuas de trabalho, colocando
essas pesquisadoras em uma situação de maior vulnerabilidade nesse período e
afetando, inclusive, sua saúde mental. Essas novas configurações entre o produtivo e
o reprodutivo, público e privado, que estão se ampliando no período de pandemia, tem
desdobramentos incertos.
Os inúmeros dados trazidos no artigo mostraram que apesar de avanços na
equidade de gênero em relação ao acesso ao ensino superior e na pós-graduação no
Brasil, ainda persistem desigualdades em termos horizontais participação de
mulheres se concentra em áreas específicas e, por vezes, de menor valorização e
renda; e verticais, com ainda reduzido número de mulheres que ocupam as posições
mais elevadas da carreira acadêmica e de pesquisa e que recebem os incentivos por
produção. Na academia a realidade que se impõem não destoa do resto da sociedade,
a pandemia afeta homens e mulheres de maneira distinta devido a desigualdades
previamente existentes, mas que foram acentuadas com a crise.
Conforme apresentamos neste artigo, a emergência de espaços alternativos de
interação, debate e formatos de publicação científica ganharam força neste período
de crise e poderão impactar não somente na dinâmica de produção da C&T, mas
tamm no seu modo de avaliação. A mudança na estrutura dessas publicações,
assim como sua divulgação de forma mais rápida e transparente ciência aberta,
poderá criar um ambiente propício para a interação e incluo de novos atores na
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construção do conhecimento, mais colaborativo e inclusivo, mas também poderão
acentuar ou criar novas desigualdades, uma vez que i impactar no modelo de
avalião e distribuição de recursos. Assim, os efeitos dessas novas práticas de
produção e avaliação científicas em longo prazo e se elas irão se traduzir em
mudanças positivas para grupos vulnerabilizados e no estreitamento de laços com a
sociedade em geral, incluindo outras vozes e saberes depende de inúmeros fatores,
inclusive da mobilização desses grupos para a proposição de ações e políticas de
inclusão e equidade.
Neste sentido, pensamos que os desafios trazidos pela crise sanitária,
econômica e social que vivenciamos poderiam fazer emergir na ciência a urgência de
um diálogo transformador com as práxis feministas. Dessa forma, o debate e a
compreensão desses processos o cruciais para que possamos participar
ativamente na construção de um novo paradigma que atenda às necessidades de
sujeitos coletivos que hoje são marginalizados e silenciados no mundo da ciência. As
transformações nessa direção se colocam como uma possibilidade, mas, com certeza,
não se realizarão sem esforços e engajamento, não apenas de mulheres ou de
mulheres feministas, mas da comunidade produtora de ciência e pesquisa.
Buscando lançar luz sobre os caminhos alternativos e estratégias de boas
práticas, destacamos algumas iniciativas e recomendações encontradas nos materiais
analisados. Entre as propostas de rotas de ação específica para a academia,
ressaltamos a necessidade de dimensionar o impacto da pandemia para as mulheres
e outros grupos minoritários e de responder a realidade encontrada dentro dos planos
estratégicos das instituições, visando transformar critérios de avaliação e
produtividade. Pontuamos ainda ações de caráter mais amplo e estrutural que dizem
respeito a dimensões da estruturação econômica e social geral e das instituições
superiores de ensino e pesquisa como ampliar infraestrutura para atendimento de
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crianças, idosos e enfermos; criar ou ampliar espaços urbanos e institucionais de
acolhimento e cuidado compartilhado, que podem envolver desde cozinhas
comunitárias até acolhimento psíquico, entre outras finalidades; redução geral nas
jornadas de trabalho; entre outras.
Concluímos, sendo novamente assertivas quanto à necessidade de que
ampliemos medidas institucionais para promoção da inclusão, permanência e
ascensão das mulheres no ambiente acadêmico, fornecendo também condições para
que a maternidade e o cuidado familiar sejam realmente compatíveis com a carreira
de pesquisa, além de que o pensamento sobre o sustentar e cuidar a vida ganhe
espaço como tema de pesquisa e debate. Ressaltamos ainda a urgência de realizar
um conjunto de ações coordenadas e politicamente comprometidas com a produção
de condições estruturantes para que a prática científica não iniba, penalize ou exclua
as mulheres e dentro do campo do gênero considere as sobreposições devido a
classe, a raça ou imputadas às pessoas com sexualidades dissidentes.
Assim, reiteramos que as transformações devam incluir uma profunda e
criteriosa revisão das normas e estruturas da produção científica, ou seja, envolvem
uma política científica que incorpore um enfoque feminista. Apenas com essa tarefa
assumida coletivamente, o conjunto das ciências e suas instituições no mundo pós-
pandemia poderão se tornar o que buscamos: uma ciência que privilegie ativamente
a criação e fortalecimento de relações e de conhecimentos voltados a superar as
desigualdades e as discriminações de gênero e de toda ordem.
Referências
#votelgbt+ e box1824 (2020), lgbt+ na pandemia. Desafios da comunidade lgbt+ no
contexto de isolamento social em enfrentamento à pandemia de Coronavírus.
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Revista Redes 51 ISSN 1851-7072
Disponivel em: <https://votelgbt.org/s/vote-lgbt-box1824-diagnostico-LGBT-na-
pandemia_completo.pdf>
Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo adusp (2020), Em meio
aos cuidados com filhos pequenos, pais idosos, tarefas domésticas e exigências
acadêmicas produtivistas, docentes revelam a falácia do discurso de que a USP
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Artículo recibido el 30 de junio de 2020
Aprobado para su publicación el 3 de diciembre de 2020