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DOI: https://doi.org/10.48160/18517072re55.210
Ciência, gênero e autorrepresentação: estudo da
hashtag #mulheresnaciencia no Instagram
Amanda Rezende Lopes
*
Tatiane Leal
**
Luisa Massarani
***
Resumo
Representações midiáticas estereotipadas têm sido associadas, historicamente, à
persistência de desigualdades de gênero na Ciência e Tecnologia (C&T),
demandando a produção e o estudo de representações mais diversas nesse campo.
Diante disso, o objetivo deste artigo é compreender as autorrepresentações de
mulheres cientistas nas mídias digitais, a partir do uso do Instagram em contexto
brasileiro. Para isso, propôs-se a investigação das postagens vinculadas à hashtag
#mulheresnaciencia entre outubro e novembro de 2021, por meio da análise de
conteúdo qualitativa. Verificou-se a incidência de três categorias temáticas principais:
apropriação e reconfiguração do estereótipo de “cientista”; reivindicação de gênero na
*
INCT-CPCT, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Correo Electrónico: amandarezende.jor@gmail.com
**
UFRJ. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Correo Electrónico: tatianeclc@gmail.com
***INCT-CPCT. COC. Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Correo Electrónico:
luisa.massarani@fiocruz.br
2
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C&T; e construção de identidades e subjetividades na C&T. Dentre estes eixos,
observou-se que os usos da hashtag favoreceram a circulação de representações de
mulheres na ciência sob perspectivas plurais e contribuíram para o combate aos
estereótipos, sobretudo quando as mulheres se apropriaram dos recursos
tecnológicos e exerceram a produção de si como sujeitos agentes no campo da C&T
Palavras-chave
MULHERES NA CIÊNCIA; REPRESENTAÇÃO; IDENTIDADE; ESTEREÓTIPOS; MÍDIAS DIGITAIS.
Introdução
Homem, branco, de meia-idade, com óculos de grau, vestindo jaleco branco e
trabalhando solitário em um laboratório, cercado por seus equipamentos e aparelhos:
esse é o estereótipo majoritário quando se pensa na figura de “cientista”. O imaginário
comum é verificado em diversos estudos, de variados países (Mead y Metraux, 1957;
Chambers, 1983; Kahle, 1989; Carr et al., 2009; Carvalho y Massarani, 2017), e reflete
as percepções desiguais relativas a gênero, raça e outros atravessamentos sociais no
campo da Ciência e Tecnologia (C&T). Essas suposições culturais são transmitidas e
reforçadas pelos meios de comunicação e demais agentes de socialização, os quais
fornecem modelos simbólicos de existência sobre o que é ser cientista (Steinke, 2005).
A sub-representação feminina na mídia hegemônica, com efeito, colabora para
a manutenção de estereótipos, vinculando, reiteradamente, imagens de mulheres
cientistas a características como dependência, passividade e emocionalidade (Flicker,
2003; Steinke, 2005). Reforçam, assim, concepções tradicionais de feminilidade e do
âmbito científico que impactam a percepção, a participação e o papel das mulheres
3
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na C&T, contribuindo para seu afastamento do campo científico (Flicker, 2003;
Steinke, 2005; Massarani, Castelfranchi y Pedreira, 2019).
Dado que as representações (Hall, 2016) possibilitam a orientação de práticas,
identidades e modos de vida, a contestação de estereótipos (Hall, 2016) se torna uma
estratégia fundamental para os grupos sociais historicamente discriminados em suas
lutas, para desestabilizar estruturas de poder na cultura (Hall, 2016). Essas disputas
também acontecem no âmbito da C&T, no qual as intervenções para ampliar a
participação de grupos tradicionalmente sub-representados buscam fornecer modelos
que desafiam e alteram percepções estereotipadas dos cientistas (Benson-
Greenwald; Joshi y Diekman, 2022; Steinke et al., 2021).
Não por acaso, pesquisas no campo da Divulgação Científica e dos Estudos
Sociais da Ciência e Tecnologia visam identificar continuidades e descontinuidades
das representações de sistemas de ciência na mídia, sobretudo nas áreas do
jornalismo, do cinema e da televisão isto é, nas chamadas “mídias tradicionais”
(Kirby, 2008). No entanto, poucos estudos têm se dedicado a verificar a influência dos
modelos de gênero e ciência na mídia online, que se apresenta como um espaço
contemporâneo potencial para desafiar os estereótipos de C&T e proporcionar
identificação entre grupos mais diversos e a carreira científica (Steinke et al., 2021).
Em mídias digitais como Twitter, Facebook e Instagram, destacam-se
mobilizações e debates sobre as dinâmicas entre gênero e ciência. Em diversos
países e, especificamente, no contexto brasileiro, em que os usos das redes sociais
têm ganhado centralidade em reivindicações políticas de mulheres e movimentos
feministas (Hollanda, 2019), esses meios têm sido apropriados por cientistas para a
veiculação de representações de modelos mais diversos de profissionais de C&T,
incluindo origens, experiências e trajetórias múltiplas.
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No Twitter, o movimento #EuPareçoCientista
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(inspirado pela hashtag
estadunidense #ILookLikeAScientist), lançado, em 2020, com o intuito de desmistificar
o estereótipo do cientista, recebeu bastante visibilidade no Brasil. no Facebook,
páginas como “Mulheres na ciência”
2
promovem espaços para diálogo,
compartilhamento de informações e apoio a campanhas coletivas no âmbito científico.
No Instagram, por sua vez, é possível verificar diversas propostas sobre esta temática,
como o uso da hashtag #mulheresnaciencia para dar visibilidade a iniciativas e
representações femininas no campo da C&T. Nota-se que, cada vez mais, as
cientistas estão se apropriando desses espaços digitais.
Diante desse cenário, este artigo tem como objetivo compreender os sentidos
produzidos pelas autorrepresentações de mulheres cientistas nas mídias online. Para
isso, será realizada uma análise das postagens vinculadas à hashtag
#mulheresnaciencia no Instagram, identificada como a principal hashtag brasileira
sobre o tema em questão, entre 1º de outubro e 30 de novembro de 2021.
Entende-se que recursos tecnogramaticais como hashtags conferem
significados às postagens, participando do processo de construção de sentido junto a
outros elementos como imagens e texto (Liu et al., 2017). Além disso, compreende-
se #muheresnaciencia como uma hashtag de identidade, definida por Liu et al. (2017)
como um recurso que tem sido empregado para promover o compartilhamento de
fotografias e relatos pessoais relacionados a grupos sociais marginalizados. Assim,
investigar postagens reunidas por essa hashtag permite tanto uma possibilidade de
recorte entre a multiplicidade e heterogeneidade de dados produzidos em ambientes
1
Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2020/01/movimento-no-twitter-busca-
desconstruir-estereotipo-de-cientistas.html. Acesso em: 22 fev. 2022.
2
Disponível em: https://www.facebook.com/MulheresNaCiencia/. Acesso em: 22 fev. 2022.
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digitais (Fragoso; Recuero y Amaral, 2011) quanto de compreensão dos sentidos que
circulam na rede.
A partir da metodologia da análise de conteúdo qualitativa (Bardin, 2011), busca-
se identificar tendências predominantes nas narrativas produzidas por mulheres
cientistas ao publicarem fotografias de si mesmas e relatos pessoais online. A
hipótese formulada é de que as mídias digitais, como o Instagram, podem contribuir
para o combate aos estereótipos na C&T. A justificativa deste artigo se ampara na
lacuna de pesquisas voltadas às representações de cientistas em mídias digitais
(Steinke et al., 2021). Como lembram Benson-Greenwald, Joshi e Diekman (2022),
diferentes mídias podem enfatizar distintos aspectos da cultura da C&T. Portanto, a
condução de estudos sobre as relações entre gênero e ciência em diversos meios de
comunicação e países é fundamental para observar de que modos os
contraestereótipos (Benson-Greenwald; Joshi y Diekman, 2022) constituem
obstáculos ou oportunidades para desafiar percepções limitantes sobre a ciência e os
cientistas.
Dessa forma, realiza-se, inicialmente, uma breve contextualização sobre a
relação entre mulheres na ciência e a mídia, abordando os conceitos de
representação, estereótipos e identidade. Em seguida, evidencia-se o papel das redes
sociais digitais na contemporaneidade para a promoção de mobilizações e
apropriações. Após esta fundamentação teórica, apresenta-se o percurso
metodológico e a discussão dos resultados da pesquisa. Esse trabalho permite,
portanto, avançar na compreensão sobre as relações entre gênero, ciência e mídias
digitais no cenário brasileiro contemporâneo.
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Mulheres na ciência e mídia: entre representações,
estereótipos e identidade
Para entender a relação entre gênero, ciência e mídia, é necessário, primeiramente,
compreender os conceitos de representação, estereótipos e identidade. Para Hall
(2016), o termo “representação” se refere aos processos de produção de sentido sobre
o mundo por meio da linguagem. Entendido como um processo cultural e político, a
representação de sujeitos, objetos e acontecimentos por meio de classificações,
equivalências e oposições a determinados discursos e imagens não somente reflete
identidades e a própria realidade existencial, mas ajuda a construí-las (Hall, 2016).
Ainda segundo Hall (2016), em relação à construção do “outro”, os estereótipos
constituem representações que reduzem indivíduos e grupos sociais a poucas
características simplificadas, tratadas como fixas pela natureza. A estereotipagem se
utiliza, justamente, da estratégia de cisão entre “eles” versus “nós” para, em seguida,
excluir ou expelir o que é considerado diferente, como parte da manutenção da ordem
social e simbólica. Assim, devido às desigualdades de acesso ao poder, as
estereotipagens são dirigidas, frequentemente, a grupos subordinados. Além disso,
por conta de sua centralidade na cultura contemporânea, a mídia se estabelece como
um dos principais espaços de veiculação, produção, reforço e contestação de
estereótipos (Hall, 2016).
No âmbito da C&T, as concepções culturais sobre a ciência moderna
associaram-na, historicamente, ao masculino e a valores como a objetividade, a
neutralidade e a universalidade. Nesse sentido, as mulheres foram qualificadas,
durante séculos, como opostos complementares dos homens, o que indicaria
supostas características falhas como a falta de objetividade, menor capacidade
intelectual e aptidão a atividades conduzidas na esfera privada como justificativa
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para a sua exclusão do campo científico (Haraway, 1988; Harding, 1995). Ainda que
o acesso aos espaços de produção de conhecimento tenha se ampliado
consideravelmente, estereótipos sobre habilidades diferenciadas entre os gêneros
permanecem na cultura contemporânea, influenciando escolhas e percepções de
mulheres e contribuindo para a persistência de desigualdades na C&T (Olinto, 2011).
Esses significados produzidos e compartilhados por meio de representações e
estereótipos fornecem sentido às experiências e aos modos como os indivíduos se
enxergam e se posicionam na sociedade, participando, assim, da construção das
identidades individuais e coletivas (Woodward, 2000). Nesse processo de produção
simbólica, os grupos sociais que detêm o poder de representar, consequentemente,
têm o domínio sobre as definições de identidades e diferenças (Silva, 2000).
Nesta lógica, não por acaso, a imagem comum da profissão “cientista” é a de um
homem branco, e a ciência é compreendida como um campo intrínseco ao viés da
masculinidade (Mead y Metraux, 1957). Tradicionalmente, a própria aparência das
mulheres é vista como prenúncio de menos propensão a ser cientista, tendo sua
aptidão à ciência questionada por conta da exteriorização de uma fisionomia vinculada
à ideia de feminilidade (Banchefsky et al., 2016). Esse imaginário partilhado é
produzido, reforçado e veiculado de acordo com interesses específicos (políticos,
econômicos e ideológicos) pelos meios de comunicação, uma das fontes de
referenciais para a identificação de quem pode e/ou do que é ser um cientista (Steinke,
2005).
Analisando os efeitos da mídia nas sociedades (ou a “política da imagem”), pode-
se verificar constantes questionamentos e disputas sobre o que se representa (Hall,
2016). Em produções audiovisuais, por exemplo, o papel de “cientista” é
constantemente apresentado pela figura de um homem (Flicker, 2003). Quando
representadas, as mulheres cientistas se encontram em posições subalternas e,
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frequentemente, precisam lidar com dilemas emocionais e com a dicotomia entre a
conquista do sucesso profissional e a obediência a características ditas femininas
(Flicker, 2003). Alguns estudos demonstram certo avanço na representação de
mulheres ligada historicamente à dependência, emocionalidade, atratividade e
passividade, verificando perfis mais diversos para elas no contemporâneo (Steinke,
2005; Steinke y Paniagua Tavarez, 2017). No entanto, ainda hoje, a relação entre
gênero, ciência e mídia permanece baseada em estereótipos (Benson-Greenwald;
Joshi y Diekman, 2022).
Conforme afirma Hall (2016), as sociedades estão imersas no mundo das
imagens. Para combater os estereótipos entre gênero e ciência, portanto, as visões
contemporâneas dos papéis dos cientistas se apresentam como potencialidades de
reflexão e produção de contraestereótipos (Benson-Greenwald; Joshi y Diekman,
2022), isto é, representações que desafiam os estereótipos comuns. Dado que a
construção da ciência nos meios de comunicação é uma prática cultural, suas
representações constituem os entendimentos públicos da ciência (Benson-
Greenwald; Joshi y Diekman, 2022). É preciso, então, que o mainstream reconheça
práticas que buscam comunicar ciência sob pontos de vistas considerados marginais
no campo científico, contemplando abordagens mais inclusivas e que se
contraponham ao predomínio masculino-branco. Assim, abre-se espaço para
contribuições em contextos complexos e com valores compartilhados relativos à
diversidade (Finlay et al., 2021).
Esse argumento evidencia os saberes parciais, localizados, críticos e apoiados
em redes de conexão, pelos quais os objetos do conhecimento são reconhecidos
como atores e agentes (Haraway, 1988; Harding, 1995). A multiplicidade de pontos
de vista, neste aspecto, impacta a forma como se entende o mundo e a ciência, a
partir da compreensão de que os saberes são, sim, situados, interpretados, parciais,
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incompletos e únicos. Por essa razão, alega-se que o processo de divulgar ciência
deve ser regulado pela multiplicidade, ouvindo vozes de grupos marginalizados
(Halpern, 2019).
Desenvolvendo-se como um campo de prática e pesquisa, a própria divulgação
científica, sob variadas formas e abordagens feministas, também evoca questões de
equidade, diversidade e inclusão, abrangendo atravessamentos de raça, classe,
gênero e acesso ao poder. Essas diferentes concepções se apresentam como
oportunidades para questionar, desafiar e desenvolver a prática da divulgação
científica, enfatizando a necessidade de um enfoque multicultural, da valorização da
pesquisa desenvolvida em países periféricos e do fortalecimento de diferentes
identidades nos espaços de produção da C&T (Leal y Salvi, 2021; Lewenstein, 2019).
Em relação à produção de representações culturais de gênero, nota-se que há,
comumente, duas modalidades: a heterodesignação, em que outros distinguem a
identidade das mulheres; e a autodesignação, quando as próprias mulheres
descrevem suas identidades. Por terem sido sistematicamente heterodesignadas pela
ciência e por outros atores ao longo da história, é notável que as mulheres cientistas
clamam por mais autodesignações (Maffia, 2002).
Na autodesignação (ou representação de si, fazendo um paralelo com os
estudos da cultura), o papel social de um indivíduo é representado pela expressão
que ele realiza de si mesmo, por meio de símbolos verbais e não verbais (Goffman,
1985). Portanto, as práticas de autorrepresentação permitem a construção de
significados e sentidos sobre pessoas e grupos sociais a partir de suas próprias visões
(ou narrativas de si), conferindo alternativas para a produção de subjetividades e
identidades em caráter contra-hegemônico. Nesse contexto, constata-se que as
práticas de autorrepresentação que se desenrolam no âmbito midiático,
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especialmente nas redes sociais digitais, possuem papel central na produção de
subjetividades contemporâneas (Campanella, 2019).
Portanto, as mulheres cientistas, enquanto produtoras de suas
autorrepresentações, demonstram suas próprias perspectivas como agentes e
discutem elementos identificados em seus meios sociais. Nessa dinâmica, elas
atribuem sentidos que perpassam os âmbitos de gênero, ciência e seus
atravessamentos, e propõem modelos de seus papéis sociais (Liu et al., 2017; Hall,
2016; Goffman, 1985). Assim, as experiências de autorrepresentação nas mídias
online, que se configuram como um fórum público em que manutenções e
autorregulações de ordens sociais, o componentes de processos socioculturais
importantes de serem analisados. Percebe-se, atualmente, uma ampliação de
conteúdos produzidos na internet a partir dessas configurações (Hollanda, 2019;
Natansohn y Rovetto, 2019; Campanella, 2019; Benson-Greenwald; Joshi y Diekman,
2022), atribuindo diferentes sentidos à dinâmica de gênero e/ou ciência. Investigar o
contexto dessas apropriações e protagonismos exige, então, a compreensão do meio
digital como espaço para novas potencialidades.
Mulheres na ciência e internet: novas possibilidades
A constituição desigual do campo científico não contribuiu para a predominância
masculina entre os cientistas durante séculos como também conferiu o viés
androcêntrico na definição de questões de estudos, projetos e resultados na ciência,
impactando o próprio “fazer científico”, assim como o desenvolvimento tecnológico,
marcado pela exclusão das mulheres (Cruz, 2002). Os homens também se
apropriaram da tecnologia (em seu sentido amplo) como uma “esfera da
masculinidade”, detendo o controle sobre produções e decisões ao longo da história,
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visto que a tecnologia se apresenta como uma importante fonte de poder e domínio
sobre o mundo.
Por outro lado, na contemporaneidade, é possível observar a tentativa de
apoderamento dessas ferramentas, incluindo a internet, a partir do enfoque de tópicos
como subjetividade, identidade, diferença, gênero, raça, classe, sexualidade, geração,
etnia, nacionalidade, entre outros (Cruz, 2002). Ainda que as tecnologias digitais
sejam perpassadas por uma série de assimetrias de poder, tanto nas possibilidades
de acesso quanto na própria estrutura das plataformas, verifica-se a apropriação
dessas ferramentas para o ativismo e resistências tecnopolíticas (Bruno et al., 2018).
Nesse percurso, as tecnologias infocomunicacionais têm sido utilizadas como
instrumentos fundamentais para as práticas feministas na América Latina, uma vez
que permitem a formação de redes e assembleias, táticas para intervenções políticas,
atuações contra as desigualdades, mais visibilidade e autonomia. Desse modo,
viabilizam, cada vez mais, iniciativas conjuntas para a reivindicação de pautas
feministas e fortalecimento de estratégias de ação política em todo o mundo (Hollanda,
2019; Natansohn y Rovetto, 2019). As mulheres organizam protestos e mobilizações
através dos espaços de interação virtuais, como ocorreu, por exemplo, com o uso das
hashtags #NiUnaMenos, #AbortoLegalYa, #MeuAmigoSecreto, #MeToo,
#PrimeiroAssédio e #EleNao
3
, que foram amplamente divulgadas nas redes sociais,
3
A campanha #NiUnaMenos surgiu na Argentina, em manifestação pelo fim da violência contra as
mulheres. #AbortoLegalYa também teve seu início na Argentina, contra a criminalização do aborto. Já
a hashtag #MeuAmigoSecreto apareceu em contexto brasileiro, a fim de denunciar o machismo no
dia a dia. #MeToo, por sua vez, foi um movimento que teve origem nos Estados Unidos, sobretudo
entre atrizes de Hollywood, contra a cultura de assédio sexual, espalhando-se por toda a América
Latina. A campanha #PrimeiroAssédio surgiu no Brasil, marcando um movimento em que mulheres
compartilharam massivamente a primeira vez em que sofreram assédio em suas vidas. #EleNao
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tornaram-se globais e não se restringiram ao meio digital, alcançando países como o
Brasil (Hollanda, 2019; Natansohn y Rovetto, 2019).
Além da reivindicação de direitos e do combate à violência de gênero, a internet
e as redes sociais digitais também o espaços para as pautas de grupos específicos,
como as mulheres cientistas, que podem usar os recursos tecnológicos disponíveis
para o tratamento de questões e reflexões de seus interesses, assim como para a
divulgação de temáticas relacionadas ao campo. Nesse sentido, a divulgação
científica, desde sua origem, respondeu não a motivações e interesses
diversificados, mas também às tecnologias e suas formas variadas (Moreira y
Massarani, 2002).
Como exemplo das recentes mobilizações de mulheres cientistas, pode-se citar
a Women in Science Writing: Solutions Summit, uma conferência estadunidense
voltada para mulheres na escrita científica, realizada em 2014, destinada a
treinamento, discussão e busca de soluções para a desigualdade de gênero e o
assédio sexual no campo de trabalho. Houve também, em 2019, um simpósio
estadunidense denominado Inclusive SciComm Symposium, criado para o debate de
questões sobre diversidade e gênero, visando uma abordagem científica com mais
inclusão, equidade e interseccionalidade (Lewenstein, 2019).
Com a pandemia da Covid-19, as medidas de isolamento também exigiram
adaptações de espaços educativos e culturais para o formato remoto, impactando
diretamente as estragias de produção de conhecimento. Um exemplo pontual dessa
reformulação é o projeto de extensão brasileiro “Mulheres Negras Fazendo Ciência”,
realizado em 2020, no Rio de Janeiro, que teve suas ações transferidas para o meio
também apareceu no cenário brasileiro, em protesto contra a candidatura de Jair Bolsonaro à
presidência da República.
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online. Para isso, seus organizadores recorreram às mídias digitais, principalmente ao
Instagram, reconhecendo a grande relevância das redes sociais para a divulgação
científica de trabalhos produzidos por pesquisadoras negras e para a popularização e
alcance do evento (Nery; Cabral y Sousa, 2021).
Promovendo um enfoque decolonial à atividade divulgativa da ciência, também
mobilizações nas mídias digitais voltadas para a visibilidade de saberes ancestrais,
latinos, afrodiaspóricos e não-eurocêntricos, em prol de maior democratização e
acesso à informação. São exemplos a conta “professoraluli” no Instagram, que
procura combater notícias falsas e desvelar racismos e preconceitos, e a playlist
colaborativa “Descolonizando a escuta”, no Spotify, cujo objetivo é compartilhar
produções decoloniais que apresentam aberturas para novas partilhas (Leal y Salvi,
2021).
Além das exposições voltadas para o coletivo, as mulheres cientistas também
atribuem sentido a essa dinâmica individualmente. De acordo com Sibilia (2015), os
enunciados sobre o cotidiano circulam em fluxo constante no ciberespaço, com a
intenção de expor universos particulares. Assim, elementos que anteriormente eram
reservados ou limitados à privacidade, como afetos, sentimentos e outras
experiências identificadas como subjetivas, estão cada vez mais presentes na esfera
pública através das mídias sociais. Há, portanto, uma crescente valorização da
exibição do “eu” e do compartilhamento de quem se é processo que está presente
na estrutura de um imperativo da visibilidade e da sociedade do espetáculo.
O novo movimento de hashtags de identidade nas mídias sociais também se
insere nesse contexto. Por meio do uso de hashtags predefinidas, os usuários da rede
compartilham fotografias e relatos pessoais para abordar experiências enquanto
indivíduos e grupos sociais marginalizados, dando rostos às suas questões. Nesse
sentido, Liu et al. (2017) analisam como o uso da hashtag #ILookLikeAnEngineer,
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criada com o intuito de se opor aos estereótipos comuns da engenharia, promoveu o
empoderamento e fortaleceu as conexões da comunidade em questão. Também são
exemplos as hashtags #ProfessionalLocs, #YesAllWomen, #IfTheyGunnedMeDown,
entre outras, que buscam desafiar estereótipos acerca de atravessamentos como
raça, gênero, aparência e profissão.
No Brasil, o movimento #EuPareçoCientista (inspirado pela hashtag
estadunidense #ILookLikeAScientist), lançado por uma astrônoma brasileira em
janeiro de 2020, é, também, exemplo de destaque. A campanha convocava as
pessoas que trabalham com ciência a publicarem fotos pessoais na plataforma
Twitter, com o uso da hashtag em voga. O seu propósito era desmistificar o estereótipo
do cientista considerado “padrão” homem, branco, genial, “esquisitão” e de pouca
sociabilidade , demonstrando a diversidade das pessoas que escolhem esta
profissão. A hashtag chegou aos Trending Topics do Twitter, categoria que elenca os
assuntos mais falados do momento em todo o mundo
4
.
Além da visibilidade, modelos de papéis críticos em C&T, ao desafiar os
estereótipos amplamente divulgados, colaboram para a mudança de percepção,
identificação e interesse de crianças e adolescentes na carreira científica e nos temas
relativos à C&T, afetando suas identidades individuais e suas visões sobre quem elas
podem ser no futuro. Assim, intervenções formadas por grupos tradicionalmente sub-
representados na C&T podem visibilizar diferentes origens e experiências no combate
às imagens estereotipadas (Steinke, 2005; Steinke y Paniagua Tavarez, 2017; Steinke
et al., 2021). Nesse sentido, é necessário observar não somente como as cientistas
4
Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2020/01/movimento-no-twitter-busca-
desconstruir-estereotipo-de-cientistas.html. Acesso em: 22 fev. 2022.
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são retratadas na mídia, mas também como elas mesmas se representam e dialogam
com essas imagens culturais, objetivo que norteia o percurso apresentado a seguir
Percurso metodológico
Com o interesse em observar as autorrepresentações de mulheres cientistas no
Instagram, em contexto brasileiro, foi realizada, inicialmente, a análise exploratória do
uso de hashtags relativas ao tema no país. Identificou-se a predominância de
combinações entre os termos “mulheres” ou “mulher” e os vocábulos “ciência”,
“ciências” ou “cientistas”, a exemplo de #mulheresnaciencia, #mulheresnaciência,
#mulheresnacienciabr, #mulheresnaciênciabr, #mulherescientistas,
#cientistasmulheres, #mulheresnasciencias, #mulheresnasciências, #mulhercientista,
#mulhernaciencia e #mulhernaciência. Posteriormente, observou-se que três delas
apresentaram números superiores a 20 mil publicações: #mulheresnaciencia (64.383),
#mulheresnaciência (23.128) e #mulherescientistas (20.374)
5
. Constatou-se, ainda,
que nenhuma das três estava ligada a uma campanha ou a um movimento específico,
sendo veiculadas, portanto, em diversas temporalidades e circunstâncias, tornando
possível examinar uma hashtag utilizada continuamente e suas apropriações
cotidianas.
Além de a hashtag #mulheresnaciencia apresentar a maior quantidade de
postagens, foi possível notar que muitas das publicações que utilizavam as demais
hashtags sobre o tema acabavam englobando, também, esta hashtag principal, que,
não por acaso, é a primeira a aparecer nas buscas do Instagram e possui grande
visibilidade em contexto majoritariamente nacional. Ademais, nas hashtags menos
5
Dados coletados até dia 31 de dezembro de 2021.
16
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frequentes, foram observadas publicações semelhantes e repetidas efetuadas pelos
mesmos perfis, o que prejudicaria o aspecto de pluralidade em suas análises.
A justificativa pela escolha do Instagram se deu por sua relevância no contexto
brasileiro e pela aderência das características da plataforma aos objetivos da
pesquisa. Além de ser uma das redes sociais mais populares no país, o Instagram
6
visa, segundo seu portal, promover a construção de comunidades, aproximar e
conectar pessoas, possibilitando a expressão, a influência e o compartilhamento de
conteúdo, sobretudo a partir de fotografias e vídeos
7
. Essa ênfase na imagem permite
usos da plataforma direcionados para a postagem de selfies e fotografias pessoais,
bem como sua associação a hashtags e conteúdos textuais, possibilitando a análise
de autorrepresentações no contexto da pesquisa.
Após análise exploratória, definiu-se o intervalo de de outubro a 30 de
novembro de 2021 para a presente análise, contemplando, ao todo, 2046 publicações
com a hashtag #mulheresnaciencia. As etapas de observação e coleta de dados foram
realizadas sem o uso de ferramentas ou recursos de filtragens. Diante disso, a escolha
desse período foi devido às características da pesquisa em mídias digitais e aos
objetivos da pesquisa.
Em primeiro lugar, a velocidade e o volume massivo de produção e circulação
de dados em ambientes digitais o chamado big data constitui um desafio para o
empreendimento de pesquisas qualitativas nesse espaço, demandando a definição de
intervalos temporais dentro do limite da capacidade interpretativa do pesquisador. Em
segundo lugar, a instantaneidade e a volatilidade dos dados publicados nessas
6
Segundo dados do #Digital2021 Report Brazil, o Instagram está na quarta posição entre as redes
sociais digitais mais utilizadas no país. Disponível em:
https://datareportal.com/reports/digital-2021-brazil?rq=brazil. Acesso em: 13 ago. 2022.
7
Disponível em: https://about.instagram.com/. Acesso em: 22 fev. 2022.
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plataformas, que podem ser facilmente editados e apagados, constitui outra
dificuldade encontrada nesses ambientes (Hine, 2016). Por conta desses fatores,
optou-se pelo recorte de dois meses, que reuniu um volume considerável de
postagens, considerando os objetivos e o caráter qualitativo da pesquisa. Selecionou-
se, ainda, o período de outubro e novembro de 2021 pela sua concomitância à
produção do artigo, de modo a obter dados mais atuais possíveis e minimizar as
possibilidades de apagamento e perda de informações pelo distanciamento temporal.
A partir da pré-análise dessas 2046 postagens, observaram-se conteúdos
voltados para a explicação de conceitos e conhecimentos do universo científico;
oportunidades, produtos e eventos científicos; homenagens, conquistas e prêmios
científicos; discussões de gênero; críticas socioculturais; entre outros; além de relatos
e registros de experiências pessoais. A partir desse resultado diversificado, com
diferentes usos, optou-se por focar apenas no material correspondente ao objetivo
desta pesquisa, viabilizando a análise qualitativa. O método para o exame dos dados
foi a análise de conteúdo proposta por Bardin (2011), que tem como etapas: a
organização da análise; a codificação; a categorização; e o tratamento dos resultados,
inferência e a interpretação dos resultados.
Assim, foram selecionadas postagens identificadas como autorrepresentações
entendidas, neste artigo, como produções de si, em que a imagem da cientista está
evidente. Ou seja, publicações que trouxeram selfies, fotografias individuais ou em
grupo das próprias mulheres administradoras dos perfis. Na análise, além das
fotografias, foram incluídas capturas de tela e carrosséis (compreendidos como uma
única unidade de postagem). Foram consideradas apenas postagens públicas e
realizadas por pessoas que se identificam como mulheres, incluindo perfis pessoais e
profissionais (desde que utilizados para divulgar as pesquisas das próprias cientistas).
18
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Além disso, foram excluídos perfis institucionais e vídeos, lives e artes de
divulgação do corpus da pesquisa, uma vez que conferem diferentes recursos para a
representação e inviabilizam a análise por sua heterogeneidade de formatos. As
etapas de observação e coleta de dados foram realizadas sem o uso de ferramentas
ou recursos de filtragens. Ao final, o corpus da pesquisa contou com 190 postagens.
Na etapa de análise, as publicações foram divididas em categorias temáticas
para a investigação qualitativa, reconhecendo que os posts do Instagram são
“multissemióticos” – isto é, contêm elementos visuais e verbais que produzem sentido
em conjunto (Polivanov y Santos, 2016). Assim, cada postagem constituinte do corpus
foi considerada como uma unidade composta por imagem(ns), legenda e demais
hashtags, permitindo o estudo qualitativo do material a partir do referencial teórico
apresentado.
A partir da codificação e categorização, foi possível verificar três categorias
temáticas preponderantes no corpus coletado, definidas a partir dos sentidos
predominantes em cada postagem: a) Apropriação e reconfiguração do estereótipo de
“cientista”; b) Reivindicação de gênero na C&T; c) Construção de identidades e
subjetividades na C&T. É interessante ressaltar que essas categorias não são
estanques, verificando-se atravessamentos de sentidos entre as postagens, nem
esgotem a complexidade de abordagens sobre o tema. No entanto, a finalidade da
definição desses picos para discussão contribui para o esforço analítico,
identificando os elementos e as potencialidades recorrentes nas postagens. Desse
modo, após a categorização temática do material, pôde-se partir para o tratamento
dos resultados, inferência e interpretação (Bardin, 2011).
Resultados e discussão
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A análise das autorrepresentações publicadas por mulheres cientistas vinculadas à
hashtag #mulheresnaciencia revelou apropriações do Instagram para a produção de
resistências às concepções culturais dominantes sobre a C&T e a imagem do cientista.
Das 190 postagens, 56 foram classificadas como a) Apropriação e reconfiguração do
estereótipo de “cientista”; 41 como b) Reivindicação de gênero na C&T; e 93 como c)
Construção de identidades e subjetividades na C&T. A discussão da análise qualitativa
dos materiais se organiza nas três categorias temáticas elencadas, que demonstram
os principais eixos de sentido encontrados no que diz respeito a potencialidades e
inovações nas representações de cientistas, dialogando e ressignificando
atravessamentos sociais na ciência.
a) Apropriação e reconfiguração do estereótipo de “cientista
Com duas placas de Petri simulando lentes de óculos, jaleco branco e luvas azuis, a
então mestranda em Ciências Farmacêuticas C. L. posa, de modo descontraído, para
uma fotografia no laboratório. Assim, apropria-se do estereótipo tradicional de
“cientista” baseado na figura de um homem, de meia-idade, com óculos de grau,
vestindo jaleco branco e trabalhando sozinho em seu laboratório (Mead y Metraux,
1957; Chambers, 1983; Kahle, 1989; Carr et al., 2009; Carvalho y Massarani, 2017)
e desconstrói o imaginário compartilhado pelo senso comum.
A foto com postura despojada vem acompanhada de uma legenda sobre o
trabalho em desenvolvimento, em que C. L. explica o seu atual projeto no ramo de
engenharia metabólica, com linguagem acessível para os usuários da rede. Entre os
elementos que compõem a sua publicação, também é possível notar uma imagem
com o rosto de Rosalind Franklin fixado em um termociclador. A química britânica
atuou no movimento do sufrágio feminino e seus estudos subversivos resultaram no
entendimento de estruturas como o carvão mineral, o grafite, o RNA viral e a
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descoberta do DNA
8
. Privilegiar o símbolo de uma mulher cientista, que teve
reconhecimentos póstumos de seus trabalhos, exibe-se como importante ferramenta
de posicionamento político e valorização da presença das mulheres na C&T.
Em outra publicação, a nutricionista R. C. também traz uma foto descontraída
com aparatos laboratoriais (touca, máscara, luvas e jaleco), em que ela expressa o
gesto conhecido como “sinal da vitória”, com dedo indicador e dedo médio esticados.
a biotecnologista C. J. compartilha um carrossel de fotografias em que está de
jaleco branco, no ambiente do laboratório e ostentando o seu diploma de mestrado,
com o anúncio “Vai ter sessão de fotos siiiim! Hahaha”
9
evidenciando a sua
conquista neste espaço de forma despojada. Ao apropriarem-se do laboratório, essas
mulheres reivindicam esse lugar para si mesmas e reconfiguram representações
tradicionais.
Fotografias de pessoas trabalhando em conjunto ou confraternizando no espaço
laboratorial são outros modelos que se contrapõem ao estereótipo de cientistas como
indivíduos solitários. A bióloga N. G., ao postar uma foto no laboratório, reconhece
que esse local de trabalho é considerado o ambiente comum aos cientistas pelo
imaginário cultural, mas aproveita a oportunidade para reforçar o seu “amor” pelo
trabalho científico realizado fora desse espaço: “Uma cientista no seu habitat quase-
natural (por que eu amo mesmo é o campo)”, divergindo, também, do ideal do
laboratório enquanto único espaço para se fazer ciência.
8
Disponível em: https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/noticia/2020/04/quem-foi-rosalind-franklin-
quimica-que-descobriu-estrutura-do-dna.html. Acesso em: 22 fev. 2022.
9
Nas citações diretas, as legendas dos posts foram mantidas em sua grafia original, contendo
eventuais gírias, abreviações de palavras ou equívocos gramaticais.
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Assim, além da notável apropriação da estrutura do laboratório (e do imaginário
de cientista trabalhando em um laboratório) para desafiar estereótipos, a partir do
corpus da pesquisa, percebe-se que esse é apenas um dentre tantos outros espaços
representados em que se pode “fazer ciência” ou atuar como mulher cientista.
registros de trabalhos em diferentes lugares, como em meio à natureza (vegetação,
baía, parque, unidade de conservação, etc.), escritório, sala de aula, instituição de
pesquisa e/ou ensino, ou mesmo dentro de casa (sobretudo em frente à escrivaninha
e notebook), entre outros.
Essa pluralidade indica, com efeito, diferentes locais em que a ciência está
presente. Neles, há, também, uniformes e aparatos profissionais diferenciados,
expressando, ainda mais, a multiplicidade da atuação científica e das próprias
vivências de mulheres cientistas. A exemplo, tem-se a publicação da estudante de
Agronomia e técnica em Meio Ambiente I. M., que, com macacão, bota e chapéu, em
paisagem rural, comenta: “Meu uniforme? - bota e chapéu / Minha missão? - alimentar
o mundo!”, relatando a função de seu trabalho perante a sociedade e exibindo
possibilidades não tão difundidas em relação à atuação científica.
a professora de Química P. F. P., ao compartilhar uma fotografia com grupo
de cinco mulheres cientistas, sentadas na grama em frente ao letreiro de uma
universidade, também se contrapõe a estereótipos típicos, tanto do laboratório quanto
da figura do cientista solitário. Em sua publicação, a sociabilidade não importa
como também é razão para o compartilhamento de afetos: na legenda, a afirmação
“Minhas filhas queridas da [universidade omitida]. Todas estão guardadas no meu
coração” demonstra o sentimento existente na relação profissional, permitindo até
22
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mesmo a brincadeira “Belas, recatadas e do Lab”
10
junto à fotografia, demonstrando
um entendimento de que a fotografia representa, em alguma medida, um desafio à
feminilidade tradicional.
Outros espaços profissionais de sociabilidade, bastante presentes no corpus da
pesquisa, são os locais de comunicação científica, a partir de registros de simpósios,
palestras, aulas, apresentações de trabalho, etc. Muito além da solidão do laboratório,
as mulheres cientistas sinalizam que se reúnem para trocas, diálogos e divulgações
de trabalhos. Além da produção científica propriamente dita, elas integram redes de
conexão e valorizam essa ação entre pares. Chama atenção, ainda, a incidência de
capturas de tela de plataformas de conversação por vídeo, contendo registros de
eventos no formato online, uma vez que o período de levantamento do corpus
coincidiu com a circunstância da pandemia de Covid-19, em que foram exigidas
medidas de isolamento em prol da saúde da população
11
.
Independentemente do recurso tecnológico priorizado (fotografias, carrosséis
e/ou capturas de tela), este eixo, em suma, traz a reconfiguração do estereótipo da
figura de “cientista”, contribuindo para representações diversas. Essas imagens estão
em constante disputa no meio social e impactam, de modo significativo, os
imaginários, as relações sociais e a cultura como um todo (Hall, 2016).
10
Referência ao meme “bela, recatada e do lar”, gerado em contexto político brasileiro e voltado ao
questionamento da feminilidade tradicional, sendo amplamente difundido nas redes sociais digitais.
Disponível em: https://f5.folha.uol.com.br/voceviu/2016/04/10001668-marcela-temer-bela-recatada-e-
do-lar-cai-nas-gracas-da-internet-em-varios-memes-confira.shtml. Acesso em: 22 fev. 2022.
11
O Brasil identificou o seu primeiro caso de contaminação pelo SARS-CoV-2 no final de fevereiro de
2020. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2021-02/primeiro-caso-de-covid-
19-no-brasil-completa-um-ano. Acesso em: 22 fev. 2022.
23
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Assim, apropriar-se do ambiente do laboratório e dos aparatos laboratoriais ou
recorrer a outros locais de trabalho e elementos que também caracterizam a profissão
incentiva a desmistificação da concepção comum sobre a área de C&T, colocando em
evidência aspectos sub-representados por grande parte da mídia tradicional. Recorrer
a símbolos ou ideias do movimento feminista também colabora para o posicionamento
político das mulheres na ciência, apontando que há uma luta por trás das conquistas
alcançadas e que é preciso manter essa batalha para que mais oportunidades e
direitos sejam estabelecidos. Além disso, junto ao caráter de sociabilidade, enfatiza-
se a noção de coletividade e a construção da ciência em conjunto.
b) Reivindicação de gênero na C&T
No corpus da pesquisa, também foram observadas publicações que buscam realizar
discussões sobre questões de gênero na C&T. Por meio de dizeres como: “Estimule
sua menina à literaturas feministas, ensine sua menina a se encher de autoestima.
Lugar de menina é onde ela quiser”, “Lugar de mulher é onde ela quiser!” e “Não tenha
medo de quebrar padrões, seja sua própria revolução”, as mulheres evidenciam a
ocupação feminina de lugares reconhecidos como indevidos para elas, além da
priorização dos desejos das próprias mulheres para as suas decisões profissionais.
Nesse aspecto, o predomínio de incentivos a outras mulheres e à sociedade,
motivando usuárias da rede a quebrarem paradigmas e a ocuparem os lugares que
desejarem, recusando os padrões impostos socialmente. Ao fazer uso da hashtag
#mulheresnaciencia e de fotografias de si mesmas para expressarem essas
mensagens, subtende-se, ainda, que elas se consideram subversivas e que se
encontram no local ansiado.
Além das imagens e dos textos, a discussão de gênero aparece, muitas vezes,
pelo uso de outras hashtags relacionadas ao tema, conferindo pistas relacionadas a
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reivindicações de gênero e à luta feminista por igualdade e ocupação de espaços de
modo igualitário. São exemplos: #mulhereemqualquerlugar, #feminismo, #feminst,
#mulheresnocomando e #mulheresemluta. Outras hashtags utilizadas enfatizam a
questão do poder, como #girlpower, #girlspower2learn, #grlpwr e #poderfeminino,
reconhecendo a atuação na ciência como símbolo de empoderamento.
Observa-se, dessa forma, o aproveitamento da expansão dos espaços
discursivos propiciados pelas redes sociais online, recorrendo a variados recursos
tecnogramaticais para a marcação de reivindicações, como o próprio uso das
hashtags. Contrapondo-se à tradicional configuração da esfera pública, as mulheres
de diferentes localidades podem se conectar, em torno de suas pautas, através das
mídias digitais. Desse modo, valorizam-se vozes silenciadas, invisibilizadas e
marginalizadas, conjecturando a expressão de movimentos de identidade (Liu et al.,
2017).
Nesse sentido, também chama atenção a presença de objetos com símbolos
relacionados ao feminismo e a mulheres cientistas históricas na composição das
imagens dos posts, como camisetas e canecas. Nessa análise, em espefico, dois
pontos podem ser observados. O primeiro deles é que as dinâmicas de consumo se
entrelaçam com noções de representação, identidade e reivindicação de gênero. O
segundo aspecto é que uma valorização do movimento feminista e do legado de
mulheres cientistas na história.
Examinando o conteúdo dessas publicações, percebe-se o entendimento de que
houve obstáculos incalculáveis para que os trabalhos de mulheres cientistas fossem
desenvolvidos, o que seria digno de inspiração, resistência e continuidade à luta por
igualdade e pela conquista de objetivos, em prol de uma sociedade mais justa. Essa
força inspiradora, algumas vezes, transforma-se em argumento direto para a “não
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desistência”, mesmo que se reconheça as circunstâncias turbulentas vigentes,
honrando suas memórias nos compartilhamentos online (Leal, 2017).
Para além do reforço da identidade e dos estímulos à ocupação de lugares
desejados, a noção de comunidade também se encontra presente na relação entre
gênero e igualdade de direitos para todas. N. S., fundadora e CEO de uma startup
relacionada à tecnologia e ciência, declara: “Eu tenho muito orgulho de empreender
na área de ciência e tecnologia sendo uma mulher. (...) eu tenho um sonho de ver
todas as mulheres ocupando qualquer espaço de forma igualitária, tenho certeza que
teremos um mundo melhor”. Ao ocupar esta posição, ela não se orgulha de sua
trajetória enquanto profissional mulher, como também expõe a ambição de que todas
as mulheres possam estar presentes nas mais diversas posições, de modo igualitário.
A docente e pesquisadora J. P., com a postagem de uma selfie, também celebra
e incentiva o protagonismo das mulheres: “Eu costumo dizer que nós mulheres somos
seres singulares que compartilham pluralidades, e é a partir dessas pluralidades que
nós lutamos e construímos nossa história”. A usuária expressa, assim, o vínculo com
as noções de rede, comunidade, proximidade e união de mulheres. Para ela, a luta
feminista faz sentido quando todas as mulheres podem alcançar conquistas, sem
hierarquias ou privilégios. Também se comunica que a categoria social “mulheres” não
é homogênea, mas que as singularidades devem ser reconhecidas e valorizadas.
Além da reivindicação de gênero na C&T em geral, exemplificada por meio das
publicações citadas, também há o apontamento de áreas específicas. Em alguns
momentos, o campo de estudo é expresso na legenda ou fica evidente por meio da
fotografia compartilhada. Já em outros casos, as áreas priorizadas são indicadas por
meio do uso de hashtags (#biologia, #ecologia, #engenharia, #odontologia, #quimica,
#fisioterapia, #educação, #nutricao, #fonoaudiologia, #literatura, #pedagogia). Dessa
forma, as mulheres cientistas demarcam não apenas a identidade de mulher na
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ciência, mas também de suas áreas principais de atuação; destacando, inclusive, a
presença feminina em seu campo (por exemplo, #globalwomenintech,
#womenintechbrazil, #MulheresNaConservacao, #mujeresenlaconservacion,
#mulheresnaodontologia, #mulheresnapericia, #mulheresdoagro).
Nas postagens, o predomínio entre as áreas de conhecimento possíveis de
serem identificadas é o de Ciências Biológicas e Ciências da Saúde. Esse dado
dialoga com o contexto brasileiro no campo da ciência, que, historicamente, as
mulheres são maioria nas ciências da vida (Olinto, 2011). Interessante notar, ainda,
que estudantes também se destacam nestas autorrepresentações investigadas,
reivindicando o papel de cientistas. Essa “tomada” de lugar durante os estudos mostra
como o reconhecimento com a dinâmica de gênero e ciência já acontece no decorrer
de sua formação. Esse fato se torna ainda mais relevante quando lembramos que, no
Brasil, as mulheres também são maioria entre estudantes universitários (Olinto, 2011).
De modo semelhante, outra reivindicação bastante presente entre as
publicações que compõem o corpus da pesquisa é a da atuação feminina na
divulgação científica. Algumas postagens realçam a importância deste lugar,
atribuindo sentidos de protagonismo. São exemplos as seguintes enunciações:
“Escrever sobre ciências é algo que quero fazer pro resto da minha vida” e “O trabalho
que me realiza: produzir e disseminar conhecimentos”. Além dessa apropriação da
atividade de divulgar ciência, algumas cientistas representam a si mesmas em
diferentes espaços de divulgação cienfica, como exposições e museus, enquanto
outras associam suas fotografias a legendas com explicações de conceitos científicos
aplicados em suas pesquisas.
Assim, as mulheres cientistas reconhecem, nas mídias digitais, importantes
canais para a divulgação científica, sobretudo de trabalhos produzidos por si mesmas
e por outras mulheres, evocando diferentes perspectivas para a C&T (Lewenstein,
27
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2019; Nery; Cabral y Sousa, 2021). Além de se afirmarem como cientistas, elas
reivindicam a identidade de divulgadora científica e reforçam a importância de uma
comunicação da ciência que reconheça as cientistas por trás das pesquisas,
especialmente quando pertencem a grupos até então invisibilizados. Esse
entendimento da divulgação científica a partir de uma perspectiva que assume o lugar
social do divulgador, para Halpern (2019), contribui para novas práticas no campo.
Ao reivindicar questões de gênero e identidade na C&T e em suas áreas, as
mulheres na ciência aproveitam os recursos das mídias digitais para possíveis
impactos aos usuários da rede. Por meio de fotografias e relatos pessoais, expressam
o desejo de gerar inspiração e motivação para outras mulheres que entram em contato
com suas publicações, influenciando suas compreensões sobre as possibilidades de
ser uma mulher cientista, apesar das dificuldades existentes na sociedade. O ato de
escrever e divulgar ciência através das mídias digitais apresenta especial relevância
nesta categoria, aliado à visibilidade e ao alcance que o Instagram pode proporcionar.
c) Construção de identidades e subjetividades na C&T
Como já visto anteriormente, identidade e subjetividade são conceitos amplos, que se
referem à definição do ser e seus modos de pensar e interagir com o mundo (Hall,
2016; Silva, 2000; Woodward, 2000). Assim, ao se autorrepresentarem e utilizarem a
hashtag #mulheresnaciencia, as cientistas evocam elementos para a composição de
suas identidades. Interessante notar, nesse sentido, que esses aspectos não são
relacionados apenas ao âmbito profissional, mas englobam outras áreas da vida.
Está presente no corpus, por exemplo, a divulgação de selfies ou fotografias dos
rostos das mulheres, demarcando expressões do eu. Em algumas delas, aparecem,
ainda, questões relativas à aparência, como em afirmações de que a postagem da
foto é possível por haver um investimento estético que permite o ato. Essas
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publicações, por um lado, reforçam a noção de feminilidade e beleza como
preocupações femininas e, por outro, confrontam a ideia de que não há espaço para
esses tópicos na ciência representada midiaticamente como área masculina e rígida,
em que as mulheres precisam lidar com a oposição entre feminilidade e carreira de
sucesso (Steinke, 2005; Massarani; Castelfranchi y Pedreira, 2019; Flicker, 2003).
Demarcando a noção de identidade, a presença de objetos nas
autorrepresentações femininas também é interessante de ser ressaltada. Além de
aparatos voltados para o exercício do trabalho, como os frequentes microscópios,
notebooks/computadores e até crachás, nota-se a grande incidência de itens como
livros. Há, assim, uma valorização do estudo e do trabalho científico como atributo
essencial de suas personalidades.
Nesse sentido, outro aspecto relevante é a estreita relação da noção de
aprendizado como sinônimo do “fazer científico”, expresso, por exemplo, em “Com 16
anos de formada, ainda me sinto uma jovem aprendiz, com uma ânsia enorme de
aprender cada vez mais, de vivenciar momentos cada vez mais especiais”. A ideia de
descoberta também é atrelada ao campo científico, uma vez que se assume o sentido
de novas contribuições a partir dos estudos, abrangendo os traços de curiosidade e
aprendizado (“Em algum lugar, alguma coisa incrível está esperando para ser
conhecida”, dizeres acompanhados de fotografia em rotina de trabalho no laboratório).
Com o mesmo enfoque em mostrar a vida cotidiana, também o comuns
registros, tanto imagéticos quanto textuais, que se aproximam do dia a dia das
mulheres, como momentos de lazer. Sobre esse tópico, nota-se uma vasta pluralidade
de situações relatadas na rede. Observam-se, a título de exemplo, fotografias junto à
natureza, com animais, com familiares, com amigos, durante viagens, em
restaurantes, na prática de atividades físicas, etc.
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Por usarem a hashtag em voga, infere-se que “ser cientista”, para essas
mulheres, não compete apenas ao setor do trabalho, mas também faz parte de quem
elas são, regendo suas identidades como um todo. Ser cientista é entendido, portanto,
como um “estilo de vida, de olhar a vida, de observar pormenores e entrelinhas e não
querer um título para ostentar”, promovendo inclusive questões de orgulho e
pertencimento. Concebe-se que as pessoas são, de fato, plurais em suas identidades
e subjetividades (“Eu sou várias coisas numa só. Eu sou cientista, pesquisadora,
professora, bióloga, (...) divulgadora científica, entre outros, pq eu me encaixo em
diferentes caixinhas”).
A mestranda em Ciências da Saúde Q. P., por exemplo, posiciona-se como
mulher cristã na ciência, destacando esse elemento identitário e modulando a
representação tradicional de “cientista(através de três publicações com fotografias
em laboratório e com elementos típicos, como jaleco branco, luvas e pipeta). Para
isso, faz uso de hashtags como #mulhercristãnaciencia, #moçacristã e
#jovensevangelicos. Apresentando tanto a religiosidade quanto a profissão como
partes de sua identidade, também confere diferentes possibilidades para a tradicional
oposição entre “conhecimento” e “crença”, comum ao debate ciência-religião (Latour,
2004).
Além do desejo de expressar a noção de pertencimento em
autorrepresentações, o reconhecimento também aparece como aspecto importante.
Publicações como “muito feliz de conhecer outras pesquisas da área, ser valorizada
como pesquisadora, compartilhar conhecimentos” expressam plenitude pela
valorização profissional. Esse desejo pode, de certo modo, ser transmitido por meio
das mídias digitais, e, em alguns momentos, torna-se indício da busca por
reconhecimento midiático (Campanella, 2019), sobretudo quando se lembra que a
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circulação de hashtags está inserida na lógica de algoritmos de alcance e visibilidade
para conteúdos indexados (DAndréa, 2020).
Pertencer e reconhecer, por sua vez, também promove a noção de coletividade.
As lutas de mulheres, sejam ela próximas ou não, são amplamente enaltecidas entre
as publicações, como em “Um trabalho de doutorado exemplar realizado com
dedicação e resiliência. Admiro sua força e garra” ou no seguinte trecho:
Quando me perguntam sobre o que mais gosto de trabalhar na minha área de atuação, eu
respondo com carinho: conhecer pesquisadores admiráveis como a [perfil omitido] [...] é
uma mulher que faz ciência numa sociedade que pouco incentiva a ciência e muito menos
acolhe uma mulher comandando um laboratório. [...]
Como pode ser percebido, o apoio e a construção de laços interpessoais fundamentais
para o desenvolvimento do trabalho científico, além de impactarem as trajetórias
pessoais das cientistas, exemplificam a importância dos afetos frente a inúmeras
dificuldades (“Correria doida, imprevistos e encontros possíveis pq acredito no
poder do afeto e na construção de laços. O ninguém larga a mão de ninguém tem sido
forte e fundamental todas as vezes que vim pra campo. Sempre encontro pessoas
dispostas a ajudar”).
Além da exacerbação de afetos diante de outras pessoas, também são
compartilhadas diversas emoções nas autorrepresentações participantes do corpus
da pesquisa. Isso ocorre tanto através das expressões faciais presentes nas
fotografias quanto por meio dos textos publicados, principalmente aqueles que
possuem abordagens mais íntimas. Os sentimentos são distintos, como o “frio na
barriga” e a ansiedade perante uma nova e desafiadora oportunidade de trabalho; ou,
então, a felicidade e o orgulho por fazer o que ama em sua profissão.
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Na dinâmica das emoções, há, ainda, a vinculação da carreira científica à ideia
de sonho de vida (“‘Início de um sonho’, dia que fiz meu primeiro experimento. Primeiro
semestre de faculdade, era tudo um misto de emoções, e pra constar os aninhos
passaram mas e eu continuo emocionada”). O sentimento de liberdade também se
encontra entre essas definições (“Me sinto livre nesse lugar, é trabalhoso, cansa
bastante em alguns momentos. Mas a parte boa é tão incrível”). Percebe-se, portanto,
um abalo da dicotomia entre razão e emoção na ciência, dialogando com novos modos
de se “fazer ciência” e pensar o “ser cientista”.
Entre essas modalidades contemporâneas, distintas abordagens presentes
no corpus do artigo, como o vínculo à infância. São observados alguns posts
realizados por perfis infantis, em que as meninas se autorrepresentam com o uso da
hashtag #mulheresnaciencia. Ainda que em menor quantidade, é interessante notar
que essas meninas expressam a vontade de se tornar mulheres cientistas, enquanto
sonhos e parte de suas identidades, compartilhando, desde já, esses desejos para os
usuários da rede. Como exemplo, tem-se a publicação de uma menina em uma
livraria, segurando dois livros relacionados à ciência nas mãos. Na legenda, ela afirma
que seu sonho é ser astrônoma, e que, sempre que um livro sobre o tema, aproveita
para aprender mais. Outra ocorrência é a divulgação de um projeto que traz curtas-
metragens e fotos sobre “mulheres brilhantes para a ciência”, com o objetivo de
“despertar o interesse de meninas pela área”.
O debate sobre a necessidade de investir em soluções para o incentivo a
meninas na área de C&T não é recente. Alguns estudos (Chambers, 1983; Carr et al.,
2009; Steinke et al., 2021) se dedicaram a pesquisar a influência da exposição de
crianças a estereótipos de cientistas por agentes de socialização, procurando
entender como essas representações poderiam afetar o interesse de meninas pela
área e suas autoidentificações com a carreira. Constata-se que parte significativa da
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mídia se baseia em papéis femininos tradicionais e difunde estereótipos de gênero na
ciência. Essas publicações na mídia online podem contribuir, por sua vez, para
representações mais plurais e para a identificação com profissionais da C&T (Steinke
y Paniagua Tavarez, 2017; Steinke et al., 2021).
Contemplando múltiplos pontos de vista em circulação nas mídias digitais, outras
postagens trazem, ainda, debates sobre diferentes perspectivas em convívio com as
identidades das cientistas e suas formas de produção de conhecimentos. Destacam-
se, principalmente, questões referentes a atravessamentos sociais, como
maternidade, classe e raça.
A partir do material examinado, é possível notar que a maioria das
autorrepresentações é realizada por mulheres jovens e brancas. Esse fato pode ser
reflexo dos diferentes modos de participação, usos, acessos, distribuições de recursos
e decisões sobre o desenvolvimento tecnológico, que variam de acordo com
interseccionalidades como gênero, raça, classe, idade e localização geográfica,
enfatizando uma realidade assimétrica (Natansohn y Rovetto, 2019), além da própria
desigualdade presente no campo da ciência. Assim, as expressões referentes aos
atravessamentos sociais, identificadas no corpus da pesquisa, sobressaem-se no
sentido de agregar representatividades e propor pontos de vista diversos para a
produção de conhecimentos (Cruz, 2002).
Como exemplo, no que se refere à questão da maternidade, é interessante
observar que as mulheres demarcam pontualmente essa relação junto à hashtag
#mulheresnaciencia, compondo suas identidades heterogêneas no meio online. Isso
ocorre, por exemplo, através do simples uso de hashtags como #maternidade e
#maternidadereal. Há, também, o compartilhamento de fotografias ao lado de filhos
em momentos de lazer. Em um contexto de reconhecimento das assimetrias de
gênero, utilizar as mídias digitais para evidenciar o atravessamento da maternidade e
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as barreiras vivenciadas por mães no campo de C&T, demonstra a necessidade de se
reafirmar a relação entre esses aspectos e as desigualdades.
Nas dinâmicas de classe, o movimento é semelhante. Para celebrar a conquista
de uma bolsa de estudos para cursar doutorado fora do país, a engenheira biomédica
V. L. A. inicia o seu relato com a seguinte frase: “Filha de pedreiro com faxineira
também faz doutorado na Europa simmmm”. Nas fotografias, aparece com os braços
contendo inscrições referentes ao PhD e envoltos ao corpo como um abraço,
sinalizando acolhimento. Ainda na legenda, afirma “hoje eu quero agradecer a mim,
porque não desisti”, o que completa o sentido do ato presente na imagem, valorizando
sua trajetória. Colocando-se como protagonista de suas conquistas, reforça a quebra
de paradigmas pelo êxito advindo de uma mulher negra com origem humilde. Assim,
ressalta sua voz a partir da interseccionalidade de pontos de vista marginalizados
(Halpern, 2019).
Outro exemplo é o da bióloga e mestre em Zoologia A. P. que, com registro
fotográfico pessoal em trabalho de campo, afirma que “Trabalhar na Amazônia é ver
mil faces de uma realidade, conhecer mil versões dos seres humanos, compreender
que a vida vai além da sua bolha!”, refletindo sobre as diversas experiências
socioculturais que impactam, diretamente, as formas de produção de conhecimento.
Entende-se, nesse sentido, que o saber científico compreende, também, o contato
com diferentes pessoas e realidades, incluindo a experimentação de situações e suas
vivências na prática, para além do estudo teórico de fenômenos. Essa maneira de
representar a si mesma, destacando os impactos da pesquisa em sua subjetividade,
desafia as concepções tradicionais que associam a ciência à neutralidade e à
objetividade.
A farmacêutica e neuroquímica Y. N., a partir do seu relato sobre a recente
mudança de país, traz uma abordagem similar, porém tratando o conhecimento de
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outras realidades como uma possibilidade proporcionada pela prática científica (“Uma
das coisas mais legais de trabalhar com pesquisa é justamente a possibilidade de
conhecer vários lugares, culturas e pessoas diferentes”). Além de contrariar o
estereótipo do “fazer científico” enquanto ação isolada e dar ênfase à questão da
sociabilidade, pensa outras formas de produção de conhecimento por meio do contato
com diversas culturas.
Outra postagem que se relaciona com questões relativas a gênero, raça e classe,
ao discorrer sobre vulnerabilidades e reconhecer a necessidade de se pensar formas
mais plurais de conhecimento, é a da cientista M. I. A partir de registro de trabalho de
campo em que observa o horizonte pela janela de um banheiro, menciona o abalo
vivido diante de situações de desigualdade e violência em pesquisas de campo,
associadas a uma mistura de sentimentos e impactos no âmbito profissional:
Estar em campo, pra mim, é um misto de alegria e angústias diante da minha impotência
ao lidar com populações em vulnerabilidade. Trabalho estudando alimentação, mas
insegurança alimentar mexe com sentimentos, com os meus e com os das famílias que
acompanho. Além disso, trabalho com mulheres, mais novas e mais velhas que eu. Em
um país como o Brasil, que além de desigual é extremamente violento conosco. Me abalo
com os relatos e com as situações relacionadas a desigualdade e violência de gênero. [...]
Assim, enquanto pesquisadora, ela não deixa de transparecer as emoções presentes
em seu trabalho, pois percebe a impotência para transformar realidades em seu ofício.
Além disso, também se identifica com as mulheres que fazem parte de seu estudo,
sobretudo no que se refere à violência e à desigualdade. A posição de cientista, com
efeito, não a impede de revisitar emoções e experiências subjetivas. Esse mesmo
desabafo aborda, ainda, as poucas referências de textos acadêmicos escritos por
mulheres negras, sistematicamente ocultadas dos estudos acadêmicos. Dessa forma,
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a autora da postagem reflete sobre o desejo de acreditar, entre tantas dúvidas, que o
seu diferencial possa estar, justamente, no próprio olhar que parte de um lugar
diferente.
Além disso, expõe conflitantes dificuldades e limites enquanto pesquisadora e
mulher, além do enfrentamento de batalhas internas: “Passei uma semana difícil, me
questionando sobre o que estou fazendo ou o que devo fazer, e até se minha pesquisa
faz sentido e se sirvo pra ser cientista”, afirma. As inseguranças do “servir” para ser
cientista surgem a partir de dúvidas e angústias no ambiente de trabalho, e também
do que ela conclui como uma característica humana: “Antes de ser cientista, sou uma
mulher, um ser humano capaz de sentir empatia. Me reconhecer nas dores das
colaboradoras desse meu trabalho faz parte”. Ser cientista, assim, é percebido como
uma identidade posterior à “mulher” e “ser humano”, que, essencialmente, é capaz de
sentir emoções como a empatia e se reconhecer nas dores dos outros.
Para ela, partindo-se de saberes localizados plurais, seria possível contestar,
desconstruir e transformar sistemas de conhecimento e visões dominantes, além de
aceitar as próprias manifestações de sentimentos. O saber científico é colocado,
então, sob o argumento de saberes localizados, em que as diferentes perspectivas
sociais exercem impacto nas formas de produção da ciência (Haraway, 1988; Harding,
1995). Portanto, demarcando seus atravessamentos sociais, M. I. se coloca no papel
de sujeito agente da produção científica não apenas para si mesma, mas reivindica
essa atribuição em espaço público, a partir do seu compartilhamento de postagem no
Instagram.
O uso da hashtag #mulheresnaciencia para dar destaque a esses debates, em
uma rede amplamente utilizada pela população do país, enfatiza, ainda, a relevância
de ter vozes plurais sendo ouvidas e alcançando diferentes públicos. Essas
abordagens, que poderiam se manter restritas a pessoas da área e/ou com realidades
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semelhantes, o, então, expostas para os usuários da rede como um todo, através
dos posts públicos. Inserindo outras hashtags, como #cienciadecolonial e
#cientistasnegras, ressalta-se a tentativa de compor unidades temáticas sobre demais
lutas e identidades que também possam ser reunidas pelos algoritmos para alcançar
públicos de interesse. Sob diferentes formas de “ser cientista” e produzir ciência,
ampliam-se as possibilidades tradicionalmente propagadas. A partir disso, torna-se
possível que mais indivíduos se vejam na imagem ou na pessoa representada
(Woodward, 2000), contemplando mais oportunidades de gerar identificação entre
grupos mais diversos e a carreira científica (Steinke et al., 2021).
Nesta categoria, verifica-se que as mulheres na ciência evocam diversos
elementos para compor suas identidades e subjetividades na C&T, acionando fatores
como memórias, afetos, emoções, fragilidades, pertencimentos, reconhecimentos,
dificuldades, laços sociais, conquistas, sonhos, atravessamentos sociais e
interseccionalidades. Ser cientista, portanto, não é “apenas” produzir ciência, mas
algo que contempla suas individualidades, singularidades e relações sociais. Ser
cientista é buscar aprendizados constantes, lutar por igualdade, preocupar-se com
aparência, inspirar-se com personalidades históricas ou outras mulheres na ciência,
valorizar companheiras de trabalho e equipes, passar por dificuldades, ressaltar suas
particularidades, construir afetos e sentir diferentes emoções. É, por fim, um estilo de
vida, dotado de possibilidades plurais.
Considerações finais
A análise das autorrepresentações das cientistas vinculadas à hashtag
#mulheresnaciencia no Instagram teve o objetivo de compreender os sentidos
produzidos pelas autorrepresentações de mulheres cientistas nas mídias online. Os
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resultados demonstram a circulação de representações plurais, que se contrapõem
aos estereótipos amplamente difundidos e divergem das imagens de mulheres
cientistas encontradas predominantemente na literatura da área. Enquanto estudos
em mídias como cinema, televisão e jornais observaram uma sub-representação das
cientistas, com representações ligadas à passividade e à dependência (Steinke, 2005;
Flicker, 2003, Massarani; Castelfranchi y Pedreira, 2019), as mulheres que se
apropriam da hashtag #mulheresnaciencia se apresentam como protagonistas e
agentes de suas próprias histórias.
Na análise das 190 publicações que compuseram o corpus da pesquisa, 56
foram classificadas como apropriação e reconfiguração do estereótipo de “cientista”;
41 como reivindicação de gênero na C&T; e 93 como construção de identidades e
subjetividades na C&T. O terceiro eixo demonstrou-se o mais numeroso, reforçando
o uso das autorrepresentações como ferramenta de produção de si. Os outros dois
eixos, no entanto, também tiveram presença significativa entre o material.
Em Apropriação e reconfiguração do estereótipo de “cientista”, mesmo quando
elementos como o jaleco branco e o laboratório estiveram presentes nos registros,
outros aspectos quebraram os paradigmas sociais tipicamente impostos, seja por
meio da descontração protagonizada pelas cientistas, pelo trabalho em conjunto ou
pela sociabilidade demonstrada. Entre outros espaços que se mostraram como
alternativas de locais para “fazer ciência”, encontraram-se a natureza e as instituições
de ensino e/ou pesquisa, com suas salas de aula e arredores, além de ambientes de
eventos científicos. Independentemente do cenário, as autorrepresentações
evidenciaram possibilidades de atuações plurais, contrapondo-se à lógica dominante.
Já em Reivindicação de gênero na C&T, assim como em suas áreas específicas
de conhecimento e na divulgação científica. Foram expressos incentivos para as
mulheres, buscando reforçar noções como empoderamento e resistência, ressaltando
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a ocupação feminina de espaços socialmente reconhecidos como indevidos para elas.
Para isso, exaltaram símbolos relacionados ao movimento feminista e às mulheres
cientistas históricas, bem como suas trajetórias, valorizando suas memórias e
conquistas. Ainda que menos numerosas entre o corpus, essas pautas foram
convocadas como potencialidade e inspiração para o alcance de mais igualdade na
C&T de modo coletivo.
No último ponto explorado, predominante na análise, notou-se que as mulheres
na ciência evocaram diversos elementos para sua Construção de identidades e
subjetividades na C&T. Assim, foi frequente a inclusão de aparatos de trabalho como
computadores/notebooks, microscópios, crachás e livros em suas imagens, expondo
a relevância do universo profissional em suas manifestações de identidade. Fatores
como memórias, afetos, emoções, fragilidades, pertencimentos, reconhecimentos,
dificuldades, laços sociais, conquistas, atravessamentos sociais e
interseccionalidades também estiveram amplamente presentes entre as publicações,
demonstrando a complexidade do “ser mulher cientista”. Destacaram-se, também, as
múltiplas perspectivas sobre identidades e formas de conhecimento(s), incluindo
discussões sobre maternidade, raça e classe, além das questões de gênero. Essas
postagens, por seu turno, proporcionaram reflexões sobre a produção de saberes
localizados, parciais e situados, contrapondo-se à objetividade historicamente
elencada como essencial à ciência e característica da masculinidade.
Enfatizando suas próprias perspectivas sociais, as mulheres se colocaram no
lugar do sujeito agente da ciência em espaço público. A apropriação da imagem da
cientista nessa rede social permitiu, portanto, a inserção da mulher em caráter de
protagonismo, como responsável pela produção de suas próprias identidades,
subjetividades e formas de produção de conhecimento. Ressignificando os
estereótipos padrões, as mulheres reafirmam suas identidades e podem impactar
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outras pessoas que acessam os seus conteúdos. Podem auxiliar, ainda, no ingresso
e no avanço de mulheres na ciência, alterando as percepções públicas sobre a
questão e despertando mais interesse na carreira e nos temas de C&T, sobretudo entre
meninas e adolescentes. Por meio das noções de proximidade, coletividade e
pluralidade, podem colaborar para as próprias vivências das cientistas em sua
profissão, estabelecendo uma rede de conexões para enfrentamento de
desigualdades. Ressalta-se, assim, que as potencialidades trazidas nessas
autorrepresentações se entrelaçam e se atravessam em suas reivindicações,
podendo ser apropriadas em conjunto para combater estereótipos na C&T. Por fim, os
resultados reforçam a importância de ampliar os estudos sobre representações de
cientistas em redes sociais digitais. Enquanto agentes e produtoras de si, as mulheres
na ciência expuseram múltiplas possibilidades sobre o “ser cientista” e o “fazer
ciência”, em um contexto de representações e imaginários em disputa. Investigar as
potencialidades trazidas por usos sociais das mídias digitais em outros contextos pode
contribuir para compreender demandas e reconfigurações da imagem do cientista no
contemporâneo e fomentar iniciativas de divulgação científica e de promoção da
equidade de gênero na C&T.
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Artículo recibido el 25 de febrero de 2022
Aprobado para su publicación el 19 de abril de 2023